Zuenir Ventura apresenta sua alterbiografia no livro 'Minhas histórias dos outros'

Em entrevista à A Tribuna, o jornalista e escritor de 90 anos faz um “resumo” dos 60 anos de jornalismo

Por: Egle Cisterna  -  01/06/21  -  11:44
  Escritor apresenta “biografia” do que escreveu de suas fontes
Escritor apresenta “biografia” do que escreveu de suas fontes   Foto: Divulgação/Bel Pedrosa

Uma alterbiografia. É assim que o jornalista Zuenir Ventura, que chega hoje aos 90 anos, define o livro Minhas histórias dos outros (Editora Objetiva). A obra, lançada em 2005, acaba de ganhar uma nova edição ampliada, onde ele apresenta ao leitor os principais personagens que fizeram parte de sua história de mais de 60 anos de jornalismo.


Clique e Assine A Tribuna por apenas R$ 1,90 e ganhe acesso completo ao Portal e dezenas de descontos em lojas, restaurantes e serviços!


“Eu gosto muito deste livro, sem cabotinismo, porque o mérito dele são os personagens. Jornalistas vivem de contar as histórias dos outros e justamente por isso não é a minha autobiografia, mas uma biografia contada a partir daquilo que escrevi sobre esses personagens”, conta o autor em entrevista para A Tribuna.


O principal destaque que ele dá para essa nova edição está no final. “A primeira edição terminava para baixo, com a história Genésio, que representava um fracasso meu”, afirma. Ele refere-se a Genésio Ferreira da Silva, que foi testemunha chave do assassinato do líder ambientalista Chico Mendes, morto em 1988, no Acre.


Na época, o jovem de 13 anos estava jurado de morte e Zuenir, que foi fazer matéria sobre o crime e um perfil da vítima, acabou trazendo o jovem para casa. “Fiz aquilo que dizem que um jornalista nunca deve fazer, que é se envolver com a notícia. Não só me envolvi, como trouxe ela para dentro de casa. Eu, com 58 anos, cheguei em casa com Genésio debaixo do braço, aumentando a família”.


Zuenir lembra que o adolescente deu muito trabalho, lutando contra uma dependência química natural em muitas crianças da região Norte – muitas recebiam álcool desde pequenos para parar de chorar, explica o jornalista. “No Rio, ele ficou internado em muitas clínicas. E também nunca se adaptou. Teve um choque cultural muito grande do homem da selva que veio para a floresta. Essa foi a história mais sofrida e mais difícil para eu escrever. Na outra edição, ficava um gosto amargo do meu fracasso”, avalia.


Agora, ele consegue mostrar o avanço de Genésio, que se recuperou do vício, está para casar e o escritor finaliza a obra com a frase que lhe traz mais felicidade: “Genésio resiste”.


Os relatos do jornalista no livro mostram não só os bastidores das reportagens, mas também apresentam ao leitor curiosidades de personalidades importantes com quem ele conviveu e entrevistou, como Darcy Ribeiro, Glauber Rocha, Carlos Drummond de Andrade, Nelson Rodrigues, Vladimir Herzog, entre outros.


Após o lançamento deste livro, Zuenir, que é membro da Academia Brasileira de Letras, autor, entre títulos, de 1968 – O ano que não terminou (cujas 48 edições já venderam mais de 400 mil exemplares) e Cidade Partida, não tem planos para voltar a escrever tão cedo outra obra e fica apenas com as colunas que faz para grandes veículos.


“Eu não gosto de escrever. Gosto de ter escrito. Para mim, o ato de escrever é muito custoso. Usar o adjetivo correto, a palavra exata, é muito difícil. Tudo que eu fiz fui obrigado a fazer pela minha mulher”, brinca ele.


Mesmo vivendo uma época na qual ele considera que haja o maior desprezo pela saúde com a covid-19, ele, que se diz um sobrevivente do tempo da tuberculose e da aids, se considera uma pessoa feliz. “Canto todos os dias Gracias a la vida, de Mercedes Sosa, por essa vida maravilhosa que sigo tendo”.


Apesar de comemorar a vida saudável mantida pelo isolamento social, Zuenir afirma que não dá para ser totalmente feliz na atualidade. “É uma contradição que não é minha, é do País. Minha leitura distópica hoje é o noticiário. O balanço diário de mortes é um sofrimento para todos. Não dá para ser totalmente feliz sabendo que as pessoas estão morrendo a sua volta. E a palavra deste ano é a depressão. Todos os amigos que conheço estão passando por isso”, lamenta o jornalista.


Logo A Tribuna