Machismo na indústria pop: Levantamento aponta sexualização nas buscas on-line por artistas

Pesquisa feita por A Tribuna revela que maiores buscas por cantoras pop relacionam pornografia e nudez

Por: Bia Viana  -  18/08/21  -  09:15
 Levantamento mostra persistência do machismo na sociedade brasileira, atingindo todas as mulheres, tenha ela alcançado ou não, alguma notoriedade
Levantamento mostra persistência do machismo na sociedade brasileira, atingindo todas as mulheres, tenha ela alcançado ou não, alguma notoriedade   Foto: TVGLOBO/DIGULGAÇÃO E REPRODUÇÃO/INSTAGRAM

Não é novidade que o machismo gera impactos na vida profissional das mulheres. Mas uma busca rápida no Google revela dados assustadores sobre o conteúdo que motiva as pesquisas sobre cantoras nacionais: quando pesquisadas pelo nome, os principais interesses de busca relacionados a elas são conteúdos pornográficos e violentos, que demonstram uma forte objetificação e sexualização da mulher.


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A pesquisa de termos de busca foi realizada em 12 de julho, visando entender o tipo e volume de buscas realizadas sobre artistas pop na internet. A partir da análise de dados, foram relacionadas quatro buscas principais: sexo, relacionamentos, beleza e idade.


A busca por sexo prioriza o corpo feminino enquanto objeto de desejo, relacionando muitos termos ligados à nudez, vídeos pornô ou vazamentos de fotos íntimas on-line. No campo dos relacionamentos, o fim de casamentos ou namoros “famosos” costumam aparecer relacionados ao nome das artistas.


Com relação à estética, o termo “antes e depois” aparece com frequência – uma busca pelas transformações visuais das personalidades. Por fim, a busca por idade atende aos mesmos requisitos dos anteriores, à margem do trabalho das artistas ou da vida profissional.


Imagem sexualizada


Cunhado pela primeira vez na década de 1970 por feministas americanas, o termo ‘cultura do estupro’ é utilizado para descrever um ambiente no qual a violência sexual contra mulheres é normalizada na mídia e cultura popular, permitindo, por exemplo, a objetificação de seus corpos e glamurização da violência sexual.


A objetificação das figuras femininas na mídia não é um fenômeno recente. Aproveitando essa cultura de violência, a indústria musical usa a imagem feminina como estratégia comercial.


Por isso, desde muito jovens, as cantoras são expostas ao marketing pautado na sexualização do corpo e comportamento erotizado, criando um ideal de beleza ‘consumível’ e projetado unicamente para estimular o consumo a partir do sexo.


Essa estratégia se perpetuou de tal forma, que muitas cantoras dependem da sexualização de sua imagem para o alcance de público. Hoje empresária e artista pop renomada, Anitta começou sua carreira no funk e usou o visual ousado no alçar de sua carreira, com roupas coladas, danças expositivas e muito rebolado. Luísa Sonza seguiu a mesma vertente, migrando para o pop, com um constante apelo sexual e letras eróticas.


Nova percepção


A linha é tênue entre o uso do sexual na arte com o empoderamento, afinal, muitas dessas artistas não são donas de suas próprias narrativas. O aporte necessário para alavancar suas carreiras ao estrelato considera apropriação de suas imagens, personalidades e comportamentos, o que torna difícil diferenciar a persona artística da mulher real e cria esse imaginário popular sexual e ofensivo.


Essa é uma pauta levantada pela própria Anitta, que sempre discursa das diferenças entre a Larissa (seu nome verdadeiro) e sua personagem nos palcos. A desumanização que distancia a pessoa e a personagem, incentivada pela exposição incessante nas redes sociais e o apelo sexual nas próprias músicas, cria essa busca injustificável pelo objeto, pelo imaginário da mulher fatal que não tem outros objetivos além de corresponder aos desejos sexuais de terceiros.


A facilitação do machismo na internet, evidenciada pela pesquisa de buscas, mostra como a violência sexual é incentivada desenfreadamente, sem quaisquer restrições e com o suporte do anonimato que só o mundo virtual pode oferecer.


Essa percepção das cantoras prejudica seu trabalho e fortalece desigualdades, bem como incentiva uma cultura de violação à privacidade feminina. O combate a essa realidade nociva vem da conscientização sobre esses formatos, estudo das desigualdades e incentivo ao protagonismo feminino, buscando novos olhares que contestem o senso comum da objetificação e tragam novas percepções da música e da arte femininas.


Segundo pesquisa inédita da União Brasileira de Compositores (UBC), lançada em março deste ano como parte do relatório Por Elas Que Fazem a Música, 79% das mulheres que participaram da pesquisa disseram ter sofrido discriminação de gênero em algum momento de sua carreira. Mesmo em um universo de apenas 252 mulheres, associadas da UBC, que participaram, a pesquisa traz um retrato sobre como é a percepção sobre as mulheres na música brasileira.


Pabllo Vittar


A LGBTfobia também encontra um sinal de alerta nas pesquisas de busca no Google. A procura por Pablo Vittar não alcança os números estelares das quatro últimas artistas, mas nas 10 principais buscas da cantora, 7 são sobre pornografia. No topo, estão pesquisas por vídeos da cantora em sites pornô, bem como nudez e ‘sexo com’ a artista.


Claudia Leitte e Ivete Sangalo


Claudia Leitte também enfrenta números assustadores nas buscas. São 16,2 mil que se relacionam a nudes ou vídeos sexuais. Entre os itens de busca, também há relacionamentos, filhos e imagens da estrela pop antes da fama. Do mesmo nicho, Ivete Sangalo não tem o mesmo volume de buscas sexuais, mas um aumento das buscas pela idade e filhos.


Luísa Sonza


A cantora pop, tem grandes volumes de buscas mensais, e todas são direcionadas à sexualização. A busca por “nudes” da cantora (fotografias nua), escrita em diferentes grafias (como “nudes Luísa Sonza”, “nude de Luísa Sonza” e variações próximas), soma 38,9 mil buscas mensais. Outras pesquisas relacionadas à cantora buscam seus relacionamentos, por isso, Vitão, Dilsinho e Whindersson Nunes são mencionados. Na pesquisa sobre perguntas relacionadas à cantora, buscas ofensivas mencionando nudez explícita também concentram grande volume, um sinal de alerta para o fomento de violências sexuais na internet.


Anitta


A cantora Anitta acendeu polêmicas na internet neste ano ao revelar ter feito uma tatuagem estratégica nas partes íntimas. A situação acendeu as buscas pela ‘tatuagem’ da cantora, que concentraram um volume de 225 mil buscas. As buscas por Anitta relacionando nudez e pornografia somam 348,1 mil. Considerando esses e mais termos relacionados à sexualização da cantora, são 615 mil buscas por pornografia e estética da cantora, alcançando o número total de pesquisas unicamente pelo nome da artista, que configuram 673 mil.


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