Filme 'Todos os Mortos' evidencia a estrutura social brasileira

Obra foi exibida na competição internacional do Festival de Cinema de Berlim no domingo

Por: Rui Martins - De Berlim  -  26/02/20  -  10:44
Longa-metragem mostra que a sociedade mantém a mesma estrutura social racista
Longa-metragem mostra que a sociedade mantém a mesma estrutura social racista   Foto: Reprodução/YouTube

A última cena do filme brasileiro Todos os Mortos, exibido domingo (23)  na competição internacional do Festival de Cinema de Berlim, mostra uma dolorosa realidade: muita coisa mudou, a escravatura terminou há mais de um século, porém, a sociedade brasileira praticamente mantém a mesma estrutura social racista.


O momento de se mudar tudo, explicou um dos diretores do filme, Caetano Gotardo, passou sem ter se concretizado. Agora, a tendência vai na direção de uma estratificação, lembrando de certa forma a África do Sul. Com a agravante de uma polarização religiosa entre os evangélicos, consumindo um cristianismo modelado e exportado pelos americanos, e as crenças trazidas da África pelos escravos.


Uma síntese do filme


Dez anos depois de terminada a escravatura, a família Soares, de três mulheres, se sente perdida em São Paulo, após a morte de sua última empregada doméstica. A família, que já possuía plantações de café, está agora à beira da ruína e luta para se adaptar.


Ao mesmo tempo, a família Nascimento, que trabalhava como escrava na fazenda Soares, agora se vê à deriva em uma sociedade em que não há lugar para negros recentemente libertados. Em Berlim, os diretores do filme, Gotardo e Marco Dutra explicaram a criação do filme, aproveitando para criticar a atual situação brasileira.


Segundo Gotardo, quando ele e Dutra começaram a imaginar esse projeto, eles refletiram sobre a estrutura de nossa sociedade hoje. "Era 2012 e nestes oito anos essa estrutura não mudou. Nessa época, o Brasil poderia ter tomado outro rumo e organizado a sociedade de maneira diferente. Surgiu a ocasião para isso, mas ela não foi utilizada".


Como explica, houve muita pesquisa e nesses anos seguiram com atenção todos os debates sobre o sexo, classe, raça, debate "que está presente hoje, num nível ainda mais complicado. E todos que participaram a seguir do projeto puderam contribuir num clima de cooperação ecolaboração".


Para o diretor, em geral as pessoas pensam que os brancos são a classe média, mas isso é falso. "Quando lemos uma história, um fator dominante é se o personagem é branco. Refletimos sobre esse estatuto e sobre as relações interraciais".


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