'Caminhamos para um estado totalitário', diz Roberto Birindelli

Ator revela como está sendo sua rotina no isolamento social e relata de que forma imagina a vida depois da pandemia

Por: Do Estadão Conteúdo  -  20/07/20  -  16:13
'Caminhamos para um estado totalitário', diz Roberto Birindelli.
'Caminhamos para um estado totalitário', diz Roberto Birindelli.   Foto: Divulgação

Roberto Birindelli estava contando os dias para a estreia de Nos Tempos do Imperador, próxima novelas das 18h da Globo, quando a pandemia do novo coronavírus forçou a paralisação das gravações. Com isso, a emissora colocou uma edição especial de Novo Mundo no lugar e ele viu seu trabalho na pele do General Solano López ser interrompido por mais tempo do que o planejado. Afinal, o personagem aparece apenas no primeiro capítulo e retorna na fase final da trama que apresenta a Guerra do Paraguai. Mesmo com essa mudança de planos, o ator continua no ar. Atualmente, o público pode vê-lo na reprise de Apocalipse, às 20h45, na Record, interpretando o policial Guido.

Na entrevista a seguir, o uruguaio de 57 anos comenta sobre a edição especial de Apocalipse e quais são as lembranças mais especiais do folhetim da Record. Além disso, o ator fala do novo personagem, o General Solano López, da novela Nos Tempos do Imperador e da visão conflitante entre Brasil e Paraguai desta figura histórica. Por fim, Roberto revela como está sendo sua rotina no isolamento social e relata de que forma imagina a vida depois da pandemia.

Por conta da paralisação das gravações de Amor Sem Igual, Apocalipse voltou ao ar. Como está sendo rever a sua participação na novela?

Eu e o elenco de Apocalipse mantemos um grupo de WhatsApp até hoje, sempre nos comunicamos. Parcerias que foram ficando. Penso que a temática é tristemente atual. Caminhamos para um estado totalitário, com forte presença religiosa no governo. Normalmente é legal ver novelas antigas para entender e comparar períodos. Mas mesmo tendo sido recente, o país deteriorou tanto em poucos anos que já temos espaço para comparação e reflexão.

Quais são as lembranças mais especiais que você tem da época em que gravou Apocalipse?

O núcleo da delegacia foi uma oportunidade de reencontrar velhos amigos, Samara Felippo e Fernando Pavão, e novos parceiros, como o Igor Cosso. A união do grupo foi o ponto mais alto de Apocalipse. Fiz amizades que vão ser para sempre!

O que mais te surpreendeu ao dar vida ao Guido de Apocalipse?

Apocalipse faz parte da série de novelas de temática religiosa, então acaba sendo mais focada na mensagem do que propriamente numa narrativa ou estudo psicológico dos personagens. Quando a história migra para o terreno mais ficcional, com anticristos e final dos tempos, encontra Guido dividido entre os rebeldes e o dominador. Para seguir sua coerência, ele tentará proteger César (Fernando Pavão) de alguma maneira, mesmo inserido na corporação do governo. A sequência mais marcante é quando Guido executa o serial killer preso. Ele sabe que um dia vai ser condenado por isso, mas devia esse gesto ao seu amigo Luis (Marcelo Argenta). Sempre fiz mais papéis de desajustados, outsiders e até marginais. Mas Guido é correto.


Antes da pandemia do novo coronavírus impor o isolamento social, você estava gravando Nos Tempos do Imperador. Como se sentiu ao ver o trabalho sendo interrompido?

Que confusão, não é? Ainda bem que não tinha estreado. O estrago seria maior se tivesse que parar na metade, como aconteceu com a novela das 21h. Bem, só recebi o texto dos primeiros capítulos.

O que esperar do General Solano López quando Nos Tempos do Imperador finalmente puder estrear?

General Solano López aparece no primeiro capítulo da novela, onde os conflitos são apresentados. Depois retornará nos últimos quatro meses, período que abordará a Guerra do Paraguai. Tenho lido muito da história e suas versões, tendo em vista que cada país tem a própria narrativa. Sigo o que estudei na escola, no Uruguai, e também os pontos de vista brasileiro e paraguaio, obviamente conflitantes

Como estava a sua vida na época em que a pandemia do novo coronavírus se agravou no Brasil?

Eu tinha terminado de filmar La Teoria dos Vidrios Rotos, no Uruguai, e vim para o Rio de Janeiro começar as gravações de Nos Tempos do Imperador. O personagem ia entrar no primeiro capítulo e depois ia ter um intervalo de um mês. Então, após oito anos sem férias, planejei uma viagem para a Europa com Carlo, meu filho. Na verdade, não eram só férias. Eu tinha feito o filme Loop, de Bruno Bini, com Bruno Gagliasso, que ia passar nos festivais de Porto e em Manchester. Com o agravamento da pandemia, precisei adiantar a volta para 19 de março e vim direto para a quarentena.

Como está sendo a sua rotina durante o isolamento social com a sua família?

É um momento de avaliação, de introspecção, questionamento e busca da própria essência. Acho que sairemos bastante modificados. Leio, assisto séries, lavo roupa, faço faxina, cozinho. Busco não automatizar, não me habituar a uma rotina, para que o novo tenha caminhos mais fáceis para se revelar. Tenho sentido muito mais falta das pessoas do que de viagens, consumo e demais coisas periféricas.

Para você, como será a vida pós-pandemia?

Penso, leio, escuto, me informo. Então, muita coisa deve mudar: sejam hábitos de consumo, a maneira como nos relacionamos com o outro e com o meio. Pessoas deverão ser mais importantes que coisas. No Brasil a pandemia está sendo usada como ferramenta de troca política e aproveitada “para passar a boiada”. Acredito que, como as máscaras sociais, em sua grande maioria, caíram, devemos ter o agravamento da luta de classes e afastamento maior entre os grupos que pensam diferente. Pelo andar da carruagem, nem sei dizer se teremos uma democracia até o final da pandemia. 
 


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