'Superfície' revela o perigo da perda de memória

Foi um filme de autor que inspirou Superfície, cujos três primeiros episódios acabam de estrear na Apple TV+

Por: Estadão Conteúdo  -  30/07/22  -  10:17
Em Superfície, Gugu Mbatha-Raw é Sophie, que sofreu um trauma na cabeça em uma provável tentativa de suicídio
Em Superfície, Gugu Mbatha-Raw é Sophie, que sofreu um trauma na cabeça em uma provável tentativa de suicídio   Foto: Divulgação

Em boa parte de sua carreira, Veronica West escreveu e produziu séries da televisão aberta, com até 24 episódios por temporada, como Ugly Betty, Brothers & Sisters, Chicago Fire. Mas foi um filme de autor que inspirou Superfície, cujos três primeiros episódios acabam de estrear na Apple TV+, com os próximos cinco chegando semanalmente, às sextas-feiras. Mais precisamente, O Ano Passado em Marienbad, dirigido por Alain Resnais, com roteiro de Alain Robbe-Grillet, em que um homem tenta convencer uma mulher de que passaram o ano anterior juntos e combinaram de fugir, enquanto ela nega lembrar-se dele ou da promessa.


Clique, assine A Tribuna por apenas R$ 1,90 e ganhe centenas de benefícios!


Em Superfície, Gugu Mbatha-Raw é Sophie, que sofreu um trauma na cabeça em uma provável tentativa de suicídio e não se lembra de quase nada. "O filme é como um poema e nunca há uma explicação. E eu fiz a pergunta: que circunstâncias seriam necessárias para aquela situação acontecer na vida real de uma pessoa e para onde a história iria a partir daí?", disse West em entrevista com a participação do Estadão, por videoconferência.


Sophie mora em um apartamento bacanudo, tem um closet de dar inveja a qualquer um, e um casamento aparentemente perfeito. Tudo o que ela sabe lhe é dito pelo marido, James (Oliver Jackson-Cohen), pelo amante, Baden (Stephan James), pela melhor amiga, Caroline (Ari Graynor). James tem a tutela de Sophie, controlando sua vida pessoal e finanças.


"Sophie perdeu seu senso de eu, perdeu sua memória e está procurando que as pessoas a sua voltam a definam", explicou Mbatha-Raw em entrevista ao Estadão. "No fim das contas, ela precisa escavar a si mesma para encontrar sua autonomia."


Sem perceber, Veronica West tinha criado um noir. "Eu não percebi na época, porque estava pensando na personagem e em uma premissa que atiçaria o fogo para que ela procurasse compreender seu passado", contou a criadora. Mas, como as pessoas que liam os primeiros esboços de roteiro viam suspenses clássicos, ela resolveu abraçar a causa, colocando a ação em São Francisco, cenário de O Falcão Maltês e A Dama de Shanghai. Um Corpo Que Cai, o filme de Alfred Hitchcock considerado um dos melhores de todos os tempos e que também se passa na cidade, foi outra influência. O longa-metragem lida com questões como memória, suicídio e identidade.


"Usamos esse gênero clássico e locações evocativas para virá-lo de cabeça para baixo. Normalmente nessas histórias as mulheres são damas em perigo ou femme fatales. Sophie está no centro da história. Ela é a investigadora e a investigação, pois está tentando descobrir os próprios segredos de seu próprio passado", lembrou West. "Quando as pessoas chegarem ao último episódio, tudo vai ter virado de ponta-cabeça e subvertido todas as suas expectativas."


Para Oliver Jackson-Cohen, Superfície é uma versão contemporânea daqueles filmes. "Todo mundo é cheio de defeitos, traumas e segredos", observou o ator. "Quando você acha que conhece um personagem, a série dá um giro, e é preciso reavaliar como se sente em relação àquela pessoa ou à história. É uma montanha-russa deliciosamente estressante."


A série também pergunta se estamos predestinados a cometer os mesmos erros, se tivermos a chance de começar de novo. "Acho interessante porque, no mundo em que vivemos agora, estamos obcecados com a ideia de nos reinventar, de começar do zero. E Superfície diz que só dá para fazer isso se não há mentiras nem segredos", afirmou o ator.


A contemporaneidade passa também pelo elenco diverso, que conta com Mbatha-Raw e Stephan James como dois dos vértices de um suposto triângulo amoroso, e Marianne Jean Baptiste como Hannah, a terapeuta de Sophie. Mas raça e gênero não são questões colocadas. Eles apenas são quem são. "Mas é um progresso. Eu nunca vi ninguém que se parece comigo em um thriller psicológico sobre uma mulher que perde a memória", ressaltou Gugu Mbatha-Raw


"Nós estamos explorando aqui relações humanas complexas. São muitas as nuances. Nosso elenco é diverso, formado simplesmente de atores fantásticos que trouxeram grandes qualidades para seus personagens. Superfície é uma série mais universal sobre temas como segredos, mentiras, identidade", esclareceu ainda.


Perguntas

Sophie acorda nessa vida aparentemente perfeita, em uma casa bonita, um marido lindo que a ama, amigos que parecem incríveis. "E ainda assim ela pergunta: por que não me sinto completa? O que está faltando? Quem é seu eu verdadeiro", completou Veronica West. São perguntas com as quais muitos podem se identificar, mesmo sem terem perdido a memória.


As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


Logo A Tribuna