Psicóloga lista os principais impactos da tecnologia no seu comportamento

Veja até que ponto você precisa rever os seus hábitos

Por: Stevens Standke  -  03/04/22  -  18:00
Thalita:
Thalita:   Foto: Matheus Tagé

WhatsApp, Instagram, Facebook, Twitter, smartphones, internet... A tecnologia veio para facilitar a nossa vida e, a princípio, não faz mal. Mas, dependendo do modo como a utilizamos, podemos desenvolver quadros de ansiedade, depressão, compulsões, individualismo e até ficar com a autoestima baixa. Isso sem falar que algumas dessas ferramentas vêm modificando, nos últimos anos e décadas, a forma como encaramos o trabalho, as nossas conquistas pessoais e profissionais e até os nossos relacionamentos, que, em muitas situações, se tornam superficiais, fugazes. Essas são algumas das constatações que estão na tese de pós-doutorado da psicóloga e professora da Universidade Católica de Santos (UniSantos) Thalita Lacerda Nobre, que transformou seu estudo no livro recém-lançado Porque a Vida é Agora! Considerações sobre o Mal-Estar na Cultura Pós-Moderna (editora Juruá). Na entrevista, ela explica melhor os impactos da tecnologia no nosso comportamento e no dia a dia e aponta formas de lidar com essas ferramentas numa boa.


Quais impactos da tecnologia no nosso comportamento chamam atenção?


A gente passou a se relacionar de uma forma diferente com o tempo. As pessoas têm mais pressa. Elas também tendem a manter relações sociais mais fugazes e encaram, inclusive, o trabalho de um outro modo. Até um tempo atrás, você entrava numa empresa e imaginava que iria passar a vida inteira lá. Isso mudou. As pessoas passaram a se permitir sair, buscar novas perspectivas, profissões ou mesmo se dedicar a um hobby. Venho percebendo algumas dessas modificações desde antes de 2010, seja no meu consultório, nas trocas com colegas ou no dia a dia. Outra mudança relevante envolve a maneira como lidamos com as conquistas. Exemplos como o de Mark Zuckerberg (cofundador e CEO do Facebook), que evoluiu na carreira e conquistou fortuna rapidamente, têm feito com que muita gente acredite que pode chegar ao topo ou atingir determinado objetivo sem tanto esforço, sem o tempo de maturação necessário. Acontece que casos como esse são uma minoria.


E quando a pessoa percebe isso, ela acaba se frustrando, não é mesmo?


Exatamente. Esse é o que chamo de um dos mal-estares provocados pela tecnologia. Outros impactos comuns são desenvolver quadro de depressão, ansiedade, baixa autoestima ou, então, culpar o mundo por achar que ele não te deu as oportunidades que merecia.


Algumas mudanças comportamentais que citou aparecem entre as características das gerações mais novas. Só que, pelo jeito como você falou, parece que todas as faixas etárias estão sendo impactadas.


E elas estão. É como se fosse um discurso social que a internet e a própria forma de organização da vida atual ajudam a propagar, fazendo com que acreditemos que precisamos estar felizes o tempo inteiro e que sempre devemos mostrar alguma novidade ou conquista para os outros. De crianças a idosos, todas as faixas etárias andam achando que têm de expor o quanto as suas vidas são interessantes. Mas, com isso, as pessoas vão ficando empobrecidas.


No sentido emocional?


Sim. Ao levar uma vida voltada para o público, empobrecemos o contato com nós mesmos; geralmente essas pessoas passam a priorizar a opinião dos demais e esquecem de considerar o que é importante para elas. Devemos analisar: qual a razão de eu estar fazendo determinada coisa? É porque gosto e quero?


A “vida aparentemente perfeita” compartilhada e visualizada nas redes sociais faz com que as pessoas tenham dificuldade para lidar com os momentos não tão bons do dia a dia e não entendam que ninguém é feliz o tempo inteiro?


Sim. Cria-se uma ideia de espetacularização da vida. Muitas vezes, o próprio sofrimento vira um show na internet, até como uma forma de chamar a atenção. Outro mal-estar que costuma ser proporcionado pela tecnologia, e que acabou potencializado pela pandemia, é o aumento do individualismo, do narcisismo. Conforme ficamos assim, há grande risco de perdermos a empatia. Como impacto da tecnologia, também existe a chance de apresentar comportamentos compulsivos, para tentar preencher o vazio que pode haver no nosso interior. Aí entram todos os tipos de compulsão, inclusive em drogas e álcool. Dependendo do caso, a pessoa fica entorpecida para não encarar a realidade, pois ela deprime.


Por mais conectados que estejamos, muitas relações andam rasas, concorda?


Concordo. Existe uma tese que diz que a sociedade em rede é boa para o crescimento horizontal da comunicação, ou seja, compartilhamos informações com mais rapidez e abrangência, porém tendemos a não aprofundar as relações.


Qual é o maior vilão da tecnologia? O celular?


O maior vilão é o modo como a gente se organiza em sociedade e reconhece a si mesmo. Já dizia o ditado: a diferença entre o remédio e o veneno está na dose. Ferramentas como o WhatsApp e as redes sociais vieram para suprir demandas da comunicação. Até aí não existe nenhum mal. A questão é que devemos aprender e nos acostumar a usar esses recursos com moderação.


Ao mesmo tempo, há quem procure se desplugar um pouco no dia a dia.


Quando existem esses movimentos contrários, é sinal de que talvez nós estejamos cometendo alguns excessos. Isso funciona como uma espécie de tentativa de respirar um pouco. É por esse motivo que cada vez mais gente procura praticar meditação, atividades de foco e a técnica do mindfulness.


Como conviver melhor com a tecnologia no nosso cotidiano?


Primeiro, observe quanto de tecnologia você utiliza diariamente. Não existe uma quantidade nem um limite de tempo para ficarmos conectados. A seguir, analise quais são as suas reais prioridades e, como o tempo é escasso, pense como pode aproveitá-lo de uma maneira satisfatória, sobretudo para você. Vale separar um horário do dia para fazer atividades prazerosas que o deixem um pouco desconectado.


Logo A Tribuna