Molécula por molécula: nanotecnologia oferece perspectivas para transformar o futuro

A nanotecnologia oferece perspectivas para transformar o futuro, e os exemplos já estão no presente

Por: Marcus Neves Fernandes  -  13/02/22  -  22:34
Manipulando a nanociência, adentramos em um mundo inexplorado, repleto de alternativas
Manipulando a nanociência, adentramos em um mundo inexplorado, repleto de alternativas   Foto: Adobe Stock

Um milímetro dividido um milhão de vezes. Difícil imaginar, não é mesmo? Para ter um comparativo, um milímetro é o tamanho do ponto final desta frase. Ajudou?


Pois esse é o mundo de quem trabalha com nanotecnologia. No Brasil, estamos prontos para ter essa inovação até mesmo em um suco de laranja.


Essa novidade, anunciada semana passada por pesquisadores da Universidade de Campinas (Unicamp), chega em uma data marcante. Há exatos 20 anos, o País criava o Sistema Nacional de Laboratórios em Nanotecnologias (SisNano) e o Centro Brasil-China de Pesquisa e Inovação em Nanotecnologia (CBCIN).


Hoje, esse segmento movimenta R$ 10 trilhões no mundo (mais do que toda a produção de riquezas do Brasil em um ano). Uma indústria gigantesca, focada não só em criar, mas principalmente em aperfeiçoar processos. Em suma: para todo desafio, pode existir uma nanossolução.


Desafio
Em 2018, por exemplo, o Brasil estabeleceu uma meta com a indústria de alimentos para reduzir em 144 mil toneladas a presença de açúcar nos produtos. O prazo termina em novembro deste ano.


Pois esse desafio acaba de receber um enorme impulso por meio de um grupo de pesquisadores do Instituto de Química, da Unicamp.


Lá, eles criaram um método que extrai a sacarose do suco de laranja, o que representa cerca de 60% das moléculas de açúcar do suco, que contém ainda frutose, glicose, flavonas, água, vitaminas, fibras e outros compostos.


A técnica, que utiliza nanoímãs, permite obter uma bebida hipocalórica, sem alterar qualquer das principais características do produto e, de quebra, ainda acaba gerando a oportunidade de reaproveitar esse açúcar.


Custos
De acordo com o jornal da Unicamp, a sacarose retirada do suco de laranja pode ser aproveitada como açúcar tradicional de mesa ou açúcar invertido (conhecido também como mel de açúcar), agregando valor à produção e possibilitando a redução das áreas cultivadas.


Aliás, foi pensando no potencial da agricultura brasileira que, em 2013, criou-se a Rede de Pesquisa em Nanotecnologia para o Agronegócio (Rede AgroNano).


Em pouco tempo, ela já gerou uma nanopartícula capaz de reduzir o uso de água e fertilizantes em hortaliças, como nos cultivos de pimentões, tomates e alfaces, além de uma nanoemulsão de cera de carnaúba para revestimento de frutos, protegendo-os contra a perda de umidade, troca de gases e ação microbiana. Esses são apenas alguns exemplos de como a nanotecnologia pode reduzir custos, abrir novos mercados e tornar o País mais sustentável e competitivo, ampliando as oportunidades para se ter uma melhor qualidade de vida.


A quarta revolução
A nanotecnologia faz parte do que os cientistas chamam de 4ª Revolução Industrial. Ela promete mais automação, maior manipulação dos seres vivos, novos materiais e saltos na inteligência artificial, entre outros avanços. Mas por que quarta revolução? A primeira foi movida por tecnologias mecânicas, com o surgimento das máquinas a vapor e das ferrovias (no final do século 18). A segunda, no final do século 19, foi marcada pela eletricidade e a linha de montagem de carros de Henry Ford. A terceira, na década de 1960, caracterizou-se pelo surgimento da informatização e da internet.


Da fertilidade ao câncer
Dentre todos os setores do conhecimento humano, a medicina, em particular, é vista como um dos mais promissores campos para a nanociência. Um dos estudos prevê, em breve, um anticoncepcional masculino, por meio de nanomateriais que alterariam a temperatura do corpo, eliminando a produção de espermas, sem efeitos colaterais e reversível a qualquer momento. Outro ramo foca em nanomedicamentos que viajam pelo corpo e atacam apenas as células dos tumores. Nos dois casos, testes em cobaias demonstraram viabilidade nos objetivos, abrindo caminhos não só para tratamentos melhores, mas para um monitoramento sem precedentes da saúde humana.


Brasil já produz tomadas e interruptores com proteção antibacteriana para hospitais
Brasil já produz tomadas e interruptores com proteção antibacteriana para hospitais   Foto: Adobe Stock

Investimentos determinam futuro
Um ser humano com dentes perfeitos, ossos melhores e resistente a várias doenças, que são detectadas instantaneamente e, se necessário, combatidas sem efeitos colaterais.


As promessas da nanotecnologia soam como música, uma orquestra na qual cada chaga humana encontra o tom de uma esperança renovada – e muitos desses desejos já estão no palco.


Roupas, tomadas, interruptores, colchões, tábuas de carne, panelas entre outros já saem das fábricas com nanopropriedades que combatem vírus, bactérias, fungos, ácaros e mofo. Boa parte com tecnologia nacional, fruto de pesquisas que se iniciaram nas faculdades e deram origem a mais de 30 empresas nos últimos dez anos.


Potencial
Mas, se não nos falta qualidade, ainda somos nanicos diante das potencialidades. Hoje, o Brasil é o 16º em um total de 20 países que mais registram publicações de artigos de nanociência.


São 3.345 ao ano, cerca de 5% da produção mundial de conhecimento na área. Na outra ponta, a China publicou 74.387 artigos e os EUA, 23.999 (2019), e, consequentemente, respondem por 60% do investimento global.


Aliás, quando se compara a verba (pública e privada) em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), o Brasil não figura nem entre as 20 primeiras nações.


Anticárie
Nos últimos 15 anos, o investimento público foi de R$ 600 milhões e, para este ano, estão previstos pouco mais de R$ 2 milhões. Nessa conta, estão desde fármacos veterinários até um agente anticárie, à base de nanopartículas.


O primeiro é desenvolvido pela Universidade Federal de Ouro Preto (MG), junto à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); o segundo, pelas universidades Estadual e Federal de Pernambuco.


O potencial dessas e de outras inovações é imenso, gerando não apenas receitas, mas postos de trabalho, uma fatia que ficará, em sua maioria, com aqueles que desenvolverem mais a sua ciência.


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