Jovens atendem cada vez menos ligações dos pais
Como lidar com esse comportamento, sem irritações?
Para os pais, que foram criados dando satisfação aos pais deles quando saíam de casa, como entender que os filhos vão sair e dificilmente telefonarão ou atenderão suas ligações? “A comunicação mudou. Hoje, ela é multimídia, ilimitada, frenética e também indireta. Além disso, likes e feeds das redes sociais disputam a atenção não apenas dos jovens como também dos adultos”, responde a psicóloga e educadora Lúcia Teixeira, presidente da Universidade Santa Cecília (Unisanta) e autora de livros como Caminho Para Ver Estrelas, que aborda a vida dos adolescentes.
Os mais jovens preferem se comunicar por outros meios, alguns simultâneos. Geralmente falam muito pouco ao telefone e ficam mais tempo on-line. Acham que têm tanto a viver e a descobrir que, às vezes, também se esquecem de se comunicar com os pais. E os adolescentes e os jovens nem telefonam entre eles mesmos. Mandam um zap (mensagem pelo aplicativo WhatsApp), pautando a sociabilidade pela escrita ou, no máximo, por áudio.
Não por acaso pesquisa americana da empresa BankMyCel, com mais de 1.200 millennials (ou geração Y, os nascidos entre 1981 e 1996), revelou que 75% deles evitam ligações telefônicas por consumirem muito tempo e 63% dão como desculpa não perceber que o telefone tocou/vibrou.
O importante é deixar claro qual é a regra na família: o filho deve, ao menos, informar aos pais onde está, nem que seja por mensagem de aplicativo, pois disso depende também a sua segurança. Vale explicar, com paciência, que os pais não estão pedindo nada demais: precisam saber onde o filho está, buscá-lo se necessário, ver como sai de cada lugar... “As crianças e os jovens não querem pais que concordem com tudo, mas que ouçam o argumento deles. Por isso, procure conversar, saber ouvir, colocar-se no lugar do outro, ter informações sobre a rotina dele, elogiar quando o filho merece, mas deixando bem claros os limites”, orienta Lúcia, lembrando que a aprendizagem se dá pelo exemplo e que não existe família perfeita.
Há casos em que os pais ligam toda hora, por insegurança, para saber o que o filho está fazendo. A psicóloga avisa: “Sendo um bom modelo para o filho e estando presentes na vida dele, os pais podem ficar mais tranquilos de estarem cumprindo bem seu papel. O filho precisa aprender também a ter rotinas, horários a cumprir e aceitar algumas frustrações. Os pais estão, muitas vezes, sobrecarregados, cansados e sem paciência, telefonando só para dar broncas, mas educar é fornecer orientação, compreensão, conhecimento e amor”.
Há estudiosos que dizem que essa mudança de comportamento dos filhos não é boa nem ruim, apenas diferente. Um dos motivos é que digitar permite pensar no que dizer e exige menos tempo e energia. Mas será que o que está por trás é uma dificuldade de empatia, sociabilidade... dessa geração?
“A comunicação entre pais e filhos sempre foi um desafio importante. Até se fala que o principal problema de muitas famílias é a falta dela. Mas a comunicação humana não significa só transmitir informações verbais. Envolve interação afetiva e significativa. E isso pode ser alcançado de muitas formas, diferentes a cada geração”, avalia Lúcia Teixeira.
A palestrante futurista e de inovação Beia Carvalho levanta estes pontos:
- Você não vive mais num mundo linear e, sim, de mudanças exponenciais, que exige fazer muito mais do que antes e ao mesmo tempo. Seu filho está se comunicando com os amigos na porta da escola, salvando no celular um material que recebeu do professor e passando uma mensagem aos pais de que vai para o clube depois da aula.
- Só que a mãe resolve ligar sem sucesso. Quando avista o filho em casa, grita: “Por que você não atende esse telefone?” Ele retruca: “Mas eu mandei mensagem”. Há adultos querendo atenção exclusiva, sentindo-se valorizados quando o filho para tudo e telefona. Só que ele não está desvalorizando e nem expressando desamor. Apenas não vê sentido em se comunicar da forma tradicional se há outra mais rápida e eficiente.
- Pelo telefone, a comunicação é síncrona. A resposta social esperada é imediata, estilo pingue-pongue: um fala, o outro responde e assim a conversa evolui. Se não há resposta, isso sinaliza que a ligação caiu ou que a pessoa desmaiou do outro lado, talvez... Quem tem hoje pouco mais de 30 anos já cresceu se comunicando dessa forma síncrona.
- Para estarmos no compasso do mundo atual (ou menos atrasados), precisamos estabelecer mais comunicações assíncronas, liberando o outro dessa resposta imediata com atenção exclusiva. A mãe coloca no aplicativo: “Filho, os seus padrinhos virão jantar conosco hoje”. Daqui a pouco, a mensagem será lida pelo filho, enquanto <QA0>
ele estará fazendo outras coisas. É bom ver as vantagens dessa comunicação, como a liberdade de comunicar-se a qualquer hora e a praticidade de passar a mesma mensagem para vários familiares ao mesmo tempo.
- O filho costuma estar ligado nos pais – e também em outras coisas e pessoas. Os adultos que não foram treinados a fazer várias atividades ao mesmo tempo têm dificuldade de entender isso. Já quem é da geração Y para frente tende a fazer simultaneamente várias coisas, com atenção em todas.