Baixada Santista tem 117 mil habitações irregulares

Número de pessoas vivendo em áreas desconformes chega a quase 500 mil na região

Por: Redação  -  01/05/22  -  16:40
Problema habitacional na Baixada Santista não é algo recente, mas dados de estudo ajudam a entender processo de deterioração
Problema habitacional na Baixada Santista não é algo recente, mas dados de estudo ajudam a entender processo de deterioração   Foto: Vanessa Rodrigues/AT

Planejamento. Uma palavra essencial para dar andamento a uma política concreta e certeira para a questão das moradias irregulares. Neste caso, o planejamento passa por entender a extensão do problema – ou um recorte generoso dele. E o que o engenheiro Fernando Camacho encontrou acende um alerta geral: algo precisa ser feito, e logo, para que o espantoso número de 117 mil habitações, totalizando 468 mil moradores em áreas desconformes, não continue crescendo em ritmo exponencial.


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Segundo o estudo Vulnerabilidade Socioambiental na Região Metropolitana da Baixada Santista, entre 2005 e 2018, as áreas formais, com habitações regulares (que foram instituídas e possuem escritura) e tudo o mais, tiveram crescimento de 1,28% ao ano. Só em Santos foi 0,26% ao ano. Isso compõe um cenário comparável a países em desenvolvimento. Mas, na comparação com áreas informais, o cenário muda bastante.


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“Quando nós comparamos com áreas informais, a taxa de crescimento médio anual, numa ocupação irregular, está na ordem de 6,60% ao ano. Em Santos, cresce 5,32. É uma velocidade muito discrepante. Essa taxa é comparável a países subdesenvolvidos”, relata Camacho.


Ele traz outro dado comparativo. “Para se ter uma ideia: uma habitação desconforme, devido ao desperdício de água, consome duas vezes mais que uma habitação formal – esta, consome na faixa de 15 metros cúbicos por mês; uma desconforme, 30,63 metros cúbicos. Então, quando a gente fala em uma habitação desconforme, fala no dobro do consumo de água. Isso impacta no bolso de todos, pois compõe as tarifas de água”.


Questão de saúde

O engenheiro explica que, no caso da Vila Pantanal, em Santos, alvo de seu estudo de mestrado, o Rio Lenheiros é um rio “Classe 2”, ou seja, em que você pode nadar. Ele pode ser usado até para recreação. Em 260 metros, entre o momento em que nasce e o que passou pela Vila Pantanal, ele literalmente morre. “O oxigênio, que é um indicador de saúde do rio, passa de 8 mg/l para menos de 1mg/l. E a bactéria, oriunda exclusivamente das fezes humanas, tem uma concentração 2 mil vezes superior ao máximo permitido”, ilustra.


O resultado, claro, é de problemas sérios de saúde para a população que habita nesta área irregular. “É uma contaminação que gera doenças relacionadas ao saneamento ambiental adequado. O que são essas doenças? Diarreia, doenças de pele, Hepatite A, febre intestinal, e por aí afora. Nós fizemos um questionário, aprovado pelo comitê de ética, e foi relatado que 53% das pessoas entrevistadas relataram diarreia. Porém, na hora em que você vai avaliar os dados governamentais, no Datasus, só tem oito notificações no mesmo período da pesquisa. Isso significa que existe uma subnotificação”, pondera.


Ele também alerta para a degradação das matas ciliares. “Os rios precisam ter uma proteção às margens. Somente na Região temos 73 áreas em altas declividades. E isso é risco de vida”, aponta. Camacho destaca ainda a verticalização como um fator que abre espaço a uma nova demanda de pessoas no local.


“Tem pessoas que se movimentaram, como pessoas que estão migrando de outros locais, tanto aqui da Baixada como de fora. Familiares que chamam outros familiares de outros estados, e vão ocupando e verticalizando. No Núcleo Pantanal, hoje, há casas de três andares”, espanta-se. “Falta fiscalização e isso faz toda a diferença. Porque, senão, vai ser enxugar gelo, ou tapar o sol com a peneira. É possível resolver, sim, com foco nas pessoas. Na saúde ambiental e na saúde das pessoas, desde que haja projetos, ações planejadas. E responsabilidade compartilhada”, reforça o engenheiro.


Baixada Santista é destaque em ranking indesejado

Quando o assunto é moradias irregulares, no Estado de São Paulo, a Baixada Santista não tem o que comemorar. Depois da Região Metropolitana de São Paulo, a Baixada Santista é a região do Estado com o maior número de habitações em situação irregular em relação à população fixa.


Outro dado que chama a atenção: de acordo cm o SIM/CDHU (Sistema de Informações Metropolitanas), cerca de 18% dos domicílios em assentamentos precários nesses municípios (Guarujá, Cubatão, Santos e São Vicente) estão em palafitas com indicações de remoção – situações mais críticas de vulnerabilidade social, ambiental e urbana.


As informações serviram como base para proposta do Programa Vida Digna, do Governo do Estado.


“A gente vê que a Baixada e a Grande São Paulo são as áreas críticas onde esses problemas estão presentes. São as regiões que agregam a maior parte da população, onde agrega-se a riqueza e, também, a desigualdade. Os dois fatores coincidem o tempo todo”, explica Maria Cláudia Pereira de Souza, superintendente de Planejamento e Programas Habitacionais da CDHU.


No Estado, são 24% dos domicílios em estado de inadequação. A concentração das favelas é mesmo na Baixada Santista e Região Metropolitana da Capital, com mais de 2,50%, de acordo com mapa da companhia. Para a especialista, entretanto, não adianta ter um número de inadequação e não saber o que fazer.


“As perguntas estão aí. Como a gente quantifica? Como a gente identifica? Como caracterizá-los por tipologias e formas de intervenção? Como preparar adequadas soluções de atendimento? É uma qualificação dos problemas para a ação. Habitação é uma competência concorrente da União, Estado e Municípios. Não vai funcionar sem a participação integrada dos entes. E o desafio adicional, nas Regiões Metropolitanas, é essa articulação entre os municípios, entre todos os atores”, exemplifica.


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