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Há percalços no caminho da desestatização dos portos de Santos, São Sebastião e Itajaí até o final de 2022

Por: Frederico Bussinger  -  05/07/22  -  06:26
Há percalços no caminho da desestatização dos portos brasileiros, como o de Santos
Há percalços no caminho da desestatização dos portos brasileiros, como o de Santos   Foto: Divulgação

O Ministério da Infraestrutura (MInfra) divulgou, antes da vedação imposta pelo período eleitoral, o balanço de entregas do 1º semestre de 2022. Nele, foi citado que os leilões de Itajaí, São Sebastião e Santos seguem agendados para o 4º trimestre deste ano. Certamente, espera-se do ministro e do secretário de Portos que os cronogramas sejam cumpridos à risca.


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Para tanto, o Tribunal de Contas da União (TCU) deve receber os estudos até o final de julho, ainda que a Prefeitura santista “questione os leilões” e “não descarte a judicialização”. Mesmo assim, o Minfra espera uma liberação “em 60 a 70 dias”, contando que a Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) “servirá de modelo para Santos” e, talvez, com a boa vontade que o Tribunal tem demonstrado.


É possível. Mas vale lembrar que: i) o modelo santista é substancialmente distinto daquele da Codesa; ii) ao aprová-lo (Acórdão 2.931/2021), além das críticas e ressalvas (item 9.6), o TCU determinou diversas providências também para “processos futuros” (9.3.2; vários subitens do 9.4; e 9.5.2, em particular). Quase como dizendo: “dessa vez passa, mas da próxima...”.


Esses, porém, não são os únicos percalços no caminho do desiderato de se desestatizar os três portos até o final de 2022. Por exemplo: as trocas de comando e nas equipes do Minfra, Secretaria de Portos e Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), a essa altura, não provocarão solavancos nos processos? Garante-se que não. Mas, malgrado a competência dos substitutos, será mesmo? Tampouco a possibilidade de pagamento de obrigações do leilão em precatórios, fato novo surgido após leilão da Codesa e ainda pendente de decisão final?


A partir da divulgação do modelo para a Santos Port Authority (SPA), ficou claro que: i) os investimentos compromissados não são nem R$ 30 bilhões, nem R$ 18 bilhões, nem R$ 14 bilhões: são apenas R$ 4,4 bilhões. Isso incluindo-se o túnel; pois no Porto, especificamente, somente R$ 1,4 bilhão... em 35 anos; ii) já à União, antes mesmo de qualquer investimento, devem ser transferidos recursos do caixa da SPA (R$ 1,3 bilhão). Ué? “Necessidade de captação de investimentos” e “objetivo não arrecadatório” não são dois dos pilares da desestatização?


No processo de arrendamento do STS10, a verticalização (portuária e/ou logística) tem sido objeto de acalorada discussão. Necessidade e limites da regulação ex-ante e/ou ex-post é parte dela, com a balança pendendo para esta última. Mas a corrente ex-ante deve ser anabolizada com os desdobramentos do The Ocean Shipping Reform Act, recém-sancionado por Biden: complexo, ele introduz novos regramentos, define diretrizes para atuação da Federal Maritime Commission (FMC) e altera o modelo regulatório. No mesmo sentido, a dura carta do Congresso norte-americano à Maersk, CMA-CGM e Hapag-Lloyd; e gestões do presidente francês Emmanuel Macron junto à CMA-CGM para reduções de fretes, ante expressivo crescimento do lucro de armadores durante a pandemia.


Como Estados Unidos e França são históricos paradigmas para o Brasil, será que essas iniciativas reverberarão aqui? O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) já se manifestou “vendo eventuais problemas de concentração de mercado” no STS10, em processo que corre paralelamente ao da desestatização: como a questão da verticalização está presente em ambos, um não influenciaria o outro?


Recentemente, o Minfra anunciou autorizações de dois grandes novos Terminais de Uso Privado (TUPs) no Estuário e há o acordo entre Força Aérea Brasileira (FAB) e BNDES. Não previstos quando da modelagem, não alterariam a equação econômico-financeira do modelo? E a própria atratividade do leilão da SPA? Mas, ironicamente, talvez a principal má notícia para a desestatização portuária venha de outra do próprio governo; em princípio boa: as 46 estatais federais (incluindo administrações portuárias) “triplicam lucro e têm desempenho recorde”. Ante esse desempenho, sistêmico, a dialética terá que ser depurada para se justificar que “é impossível administração eficiente com essa lei de licitações”, ou “... com essa burocracia”; não?


Enfim: não são previstos investimentos exógenos significativos; e está demonstrado que é possível alcançar resultados sob o arranjo institucional-regulatório vigente. Por que, então, correr-se todos esses riscos com a desestatização das administrações portuárias; uma jabuticaba?


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