Instâncias, como do judiciário, para a regulação portuária

Por que não se pensar em 'lipoaspirar' as atribuições da Antaq, transformando-a em um STF do setor portuário

Por: Frederico Bussinger  -  02/08/22  -  15:55
Hoje, é como se o Brasil tivesse uma autoridade portuária nacional
Hoje, é como se o Brasil tivesse uma autoridade portuária nacional   Foto: Danilo Santos/Grupo Tribuna

A Medida Provisória (MP) 1.120/22 é de junho deste ano, mas o pleito para ampliação de diretorias (de três para cinco) da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) é de março de 2018. No mesmo ofício, a agência propusera aumentar de 130 para 289 o quadro de cargos comissionados, o que não está incluído na MP. Ela é justificada como meio para “permitir o amadurecimento e fortalecimento da autarquia especial”, reforçada com menções a incremento de debates, agilidade e segurança.


O ofício da Antaq foi mais detalhado: “a Lei dos Portos (Lei 12.815/13) trouxe incremento nas competências da agência, entre as quais a fiscalização de arrendatários e operadores portuários; fiscalização de autoridade portuária, TUPs (terminais privados), ETCs (transbordo de carga), IP4 (pequeno porte) e IPT (passageiros); fiscalização de EBNs (empresas brasileiras de navegação), além da licitação de terminais arrendados e avaliação de prorrogação de contratos de arrendamento”.


Precisa essa sistematização! Ou seja: a sobrecarga da Antaq decorre do que lhe atribuiu a lei de 2013; a maior parte transferido das autoridades-administradoras (AAP) em recentralização do processo decisório, esboçado inicialmente pelo Decreto 6.620/08. Hoje, é como se o Brasil tivesse uma autoridade portuária nacional. As modelagens de desestatização da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) e Santos Port Authority (SPA) deram uma volta a mais no parafuso: consolidam tais competências em contrato, e criam uma fonte de sustentação econômico-financeira da agência - uma “verba de fiscalização” anual.


A dúvida é: seria esse o único caminho para dar solução à inquestionável sobrecarga da Antaq e às críticas que seguem sendo feitas à agência? Ao invés de se adotar a estratégia de aumento da oferta (de recursos humanos e materiais), por que não se cogitar de reduzir a demanda (atribuições) da Antaq? Como? Hierarquizando-se o processo decisório, como, por exemplo, é estruturado o da justiça: juiz, tribunal, Superior Tribunal de Justiça (STJ), Supremo Tribunal Federal (STF) - concebido para questões bem específicas.


Aliás, durante os 20 anos da Lei 8.630/93 vigeu algo similar: de decisões da AAP cabia recurso ao Conselho de Autoridade Portuária (CAP) (Artigo 5º, § 1°) “no prazo de 15 dias”. Dessas, recurso ao “ministério competente” no mesmo prazo (§ 2º). O § 3º regrava, ainda, os encaminhamentos para o caso de silêncio de um e outro.


Por que não se pensar em 'lipoaspirar' as atribuições da Antaq, transformando-a em um STF do setor portuário brasileiro? O CAP em um tribunal ou STJ? E estabelecer-se em cada “complexo portuário” instância para exercer um misto de Ministério Público (fiscalização) e juiz? Lembre-se que, no modelo anterior, parte das atribuições das AAPs (Artigo 33) tinha natureza de gestão/governança, mas parte já era regulatória. Lógico que recursos a instâncias superiores seriam “filtrados” segundo regras pré-estabelecidas.


Provavelmente será arguido que: 1) a Portaria 574/18 já descentraliza competências: OK; mas uma coisa é ter-se atribuição originária, outra é tê-las por delegação; 2) que quem fiscaliza não pode julgar: em tese, sim; mas a Antaq não o faz hoje? Registre-se que boa parte da sobrecarga da Antaq pós-2013, tendo gerado, inclusive, decisões judiciais com “obrigação de fazer”, advém justamente das “novas” fiscalizações transferidas!


Pessoal? A se avaliar. Mas dificilmente esse novo arranjo demandaria contingentes menores que a somatória dos atuais quadros de carreira da Antaq e das AAPs. Ah! E esse modelo não é incompatível com o que propõe a MP: apenas reconfiguraria a governança e regulação portuárias; certamente no sentido de um padrão superior de eficiência (produtiva) e excelência (de resultados).


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
Ver todos os colunistas
Logo A Tribuna