Desestatização portuária: um bom negócio para quem?

“Quem não tem proposta discute a dos outros” (lição aprendida de velho líder sindical)

Por: Frederico Bussinger  -  22/03/22  -  07:08
  Foto: Ilustração: Max

Para além de argumentos ideológicos, a desestatização (privatização) de administrações portuárias vem sendo defendida como meio para atrair investidores e fazer investimentos que, com o modelo atual, não seriam possíveis: não com fins arrecadatórios, esclarecem as autoridades. De início, todavia, muitos desconfiavam ser grande o risco de não haver empresas interessadas, como para terminais.


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Após a primeira audiência pública em Santos, porém, constatou-se que tal desestatização tende a ser um excelente negócio para os concessionários. Mais adiante, ao se analisar o modelo, ficou claro que os benefícios para o Porto e região, decorrentes da desestatização, em si, poderão ficar aquém das expectativas. Mas a novidade mais recente é que a União também será beneficiada diretamente. E antes de todos os demais!


Concessionário: assume empresa com receitas de R$ 24 bilhões (valor presente) e compromissos de R$ 18,55 bi durante o período contratual. Para assumi-la, desembolsa pouco no curto prazo – R$ 574 mi (compra de ações) e R$ 750 mi (integralização de 25% da Túnel S.A.). Só que, ao assumir a Santos Port Auhtority (SPA), encontraria em caixa R$ 1,3 bi. Disso resultam “margem líquida” de até 40% e Ebitda superior a R$ 6 bi nos anos finais do contrato.


Porto: dos R$ 30 bi de investimentos anunciados, cerca de R$ 12 bi são investimentos previstos pelos concessionários ferroviários e futuros arrendatários; portanto não pelo concessionário. A este cabem R$ 18,55 bi, dos quais R$ 14,16 bi (76%) são para “manutenção”. Ou seja, despesas correntes, regulares, como habitualmente feitas. De Capex, propriamente dito, estão previstos o túnel (R$ 2,99 bi) e R$ 1,4 bi no Porto. E o melhor: este e todos os demais investimentos (Capex), assim como as despesas de custeio (Opex), são bancadas pelas tarifas, receitas patrimoniais e financeiras!


União: o Documento no 48, à página 37, registra uma sugestão da consultoria (procedimento, SMJ, não explícito no edital nem na minuta de contrato nem nos anexos específicos): “Caixa: (...) redução do caixa acumulado atualmente na companhia com destinação deste excedente ao atual acionista - União. É necessário portanto proceder à redução de capital e/ou eventual distribuição de dividendos previamente à realização do certame”. Essa sugestão, inclusive, poderá já ser implementada a partir da assembleia agendada para 22 de abril próximo, com a transferência de R$ 308 milhões para a União, sob a forma de dividendos (Valor, no último dia 18). Somadas todas as obrigações, a União pode auferir algo como R$ 3 bi com a desestatização. E isso no curto prazo; antes que o primeiro real seja investido, no Porto ou no túnel!


Em síntese: para o concessionário, tende a ser um excelente negócio. A União pode vir a ser beneficiada com o processo de desestatização já nesse 2022; consumando-se ele ou não. Mas, contrariando expectativas, os benefícios previstos para o Porto e região têm escala bem menor. Talvez por isso, cautela tenha sido bordão dos dirigentes de entidades no 1º Encontro Porto & Mar 2022, promovido pelo Grupo Tribuna no último dia 18.


Para que Porto e região, efetiva e significativamente, se beneficiem da desestatização, por que não o Governo Federal se comprometer com que todas as receitas decorrentes do processo, qualquer que seja sua forma, sejam neles revertidas? Isso, até agora, não está claro nem formalizado. Fica a sugestão/proposta!


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