Sigilo no Supremo

A proteção de dados pessoais é um direito, mas também não pode ser usada para encobrir a corrupção e a lavagem de dinheiro de políticos, de sonegadores e do crime organizado

Por: Da Redação  -  20/07/19  -  20:00

O sigilo é um direito do cidadão e está protegido pela lei. Portanto, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, acerta quando exige das autoridades que peçam autorização de um juiz para quebrar o sigilo de informações antes de iniciar uma investigação. Porém, quando o próprio ministro precisa vir a público para dar explicações sobre sua decisão é porque faltou consistência ela. Principalmente pelo motivo da decisão – Toffoli respondeu a pedido do filho de outra autoridade máxima, o presidente da República. Segundo investigações iniciais, o ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-DEM) fez movimentações financeiras atípicas. Sobre estas, nem o parlamentar e seu ex-auxiliar se dispuseram a dar explicações. 


A proteção de dados pessoais é um direito, mas também não pode ser usado para proteger a corrupção e a lavagem de dinheiro de políticos, de sonegadores e do crime organizado. No caso de Flávio, não há nada concreto e apenas os atos de seu ex-assessor são suspeitos, mas que podem ter contado com o envolvimento do ex-deputado estadual do Rio de Janeiro. Por isso, investigava-se. 


O sigilo não pode ser admissível como ferramenta da criminalidade. No passado até recente, contas numeradas ou anônimas que garantiam a fluidez do dinheiro ilícito pelo mundo, inclusive de grupos terroristas. Há tratados internacionais sob o compromisso de combater transações indevidas e que, inclusive, se deparam com novas tecnologias, como as criptomoedas. Neste meio, pode-se acompanhar cada remessa ou recebimento de recursos, mas não se sabe quem a faz, uma situação que os bancos centrais e os fiscos mundiais ainda não chegaram a um consenso de como poderá ser contemplada. 


A medida de Toffoli não tem efeito apenas a Flávio – vale para todo o País. Critica-se seu alcance, pois foi uma decisão monocrática. Porém, ela poderá ser alterada pelo plenário em novembro. Essa votação deverá ser antecipada, pois a Polícia Federal suspendeu investigações que envolvam compartilhamento de informações sigilosas. Isso inclui não só inquéritos sobre corrupção política, mas também organizações criminosas. 


Toffoli, contudo, contemporizou. Segundo ele, o que exige autorização judicial é a investigação de dados minuciosos, não inviabilizando o trabalho importantíssimo do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão que apontou as suspeitas sobre o caso do filho presidencial. O ministro diz que o Coaf pode passar ao Ministério Público que há alguma incoerência, quando determinada autoridade ou servidor realizou transações suspeitas, mas não o dado pormenorizado, como contas correntes e horários de telefonemas, estes sim dependentes de permissão de um juiz para serem investigados. Com restrições tão subjetivas, os órgãos públicos decidiram por completo suspender investigações. A decisão de Toffoli gerou confusão desnecessária. 


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