Saldo recorde com fragilidades
O Brasil continua cometendo o erro de adiar suas correções, como reduzir a carga tributária e o tamanho do estado
Mais que os US$ 61 bilhões de saldo (diferença entre vendas e compras externas) registrados no ano passado pela balança brasileira, a corrente de comércio foi mais impressionante, encostando em US$ 500 bilhões. A corrente de comércio é a soma de exportações com importações e permite identificar o comprometimento da economia com o comércio exterior. Em apenas um ano, esse indicador saltou 35% – em 2020, ele havia ficado em US$ 368 bilhões.
Os dois dados (saldo e corrente) são recordes históricos, mas os motivos desses desempenhos são pontuais, conforme alertam economistas, e não são necessariamente sustentáveis. Afinal, o Brasil continua cheio de falhas e cometendo o erro de postergar suas correções – reduzir a carga tributária, combater a burocracia e o tamanho do estado, melhorar o ensino básico e a capacitação dos trabalhadores já no mercado e investir em infraestrutura. O atual governo tem investido em leilões e lançou o marco do saneamento, mas isso é ínfimo para uma nação de dimensões continentais que corre bem atrás de outras nações.
Segundo especialistas, as exportações foram beneficiadas pelo efeito do dólar. No ano passado, ele saltou 7%, até perdendo para a inflação de 10%, mas atingiu pico de 13% em 24 de junho (sobre 1º de janeiro de 2021). Mas os exportadores foram estimulados mesmo pela disparada das matérias-primas. É o caso do minério de ferro, com 37% em 12 de maio (também sobre 1º de janeiro de 2021). Petróleo, carnes, soja, milho e até o café, entre outras commodities (produtos agrícolas e minerais cotados em bolsa), ficaram mais caros devido à reabertura dos países ricos, os primeiros devido à vacinação.
Nos últimos meses, os países ricos passaram a sentir uma inflação mais elevada e deverão subir os juros para combatê-la em 2022, o que tende a desacelerar o mundo. Por isso, espera-se que os preços das commodities vão arrefecer, o que já é notado com o minério de ferro e o petróleo (neste caso, o Oriente Médio mais a Rússia podem cortar a produção para manipular o preço).
Já o dólar deverá favorecer as exportações neste ano de novo, todavia mais por debilidade do Brasil. O governo pode gastar de forma irresponsável para conquistar votos e o ex-presidente Lula entoar uma campanha favorável ao aumento das despesas públicas, ambas situações que estimulam a compra da moeda americana como fator de proteção. Há ainda o impacto da estiagem no Sul e Mato Grosso do Sul (apesar da chuva no Sudeste e Bahia, a seca continua), que reduz a produtividade da soja.
Mesmo assim, não se prevê um baque na balança – os analistas ouvidos pelo Estadão e jornal Valor esperam um saldo entre US$ 58 bilhões e US$ 62 bilhões em 2022, algo bem abaixo dos US$ 78 bilhões projetados pelo governo. Mas, além das fragilidades estruturais do Brasil, é bom apontar que a indústria não é destaque nas vendas externas, um sinal da baixa competitividade do País.