Nova ordem nas Américas
A guerra da Ucrânia e a tensão com a China forçam uma atenção maior dos Estados Unidos com a América Latina
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A Cúpula das Américas começa hoje em Los Angeles sob a expectativa da Casa Branca de renovar o protagonismo norte-americano na região, ao invés do America First, lema do trumpismo. O encontro parece ser mais uma questão diplomática, mas ele está inserido em um quadro de profundas mudanças políticas e comerciais com impacto acentuado em cada um dos países da região.
O evento, inaugurado em 1994 por Bill Clinton em Miami, corre o risco de ser um fiasco diplomático muito relacionado à polarização política e à entrada de um desafiador econômico, a China, indicando que até na América Latina há uma “nova ordem”. Por isso, a decisão de Washington de excluir Nicarágua, Venezuela e Cuba sob a alegação de desrespeito à Carta Democrática Interamericana gerou uma onda de boicote.
O presidente mexicano López Obrador não vai, assim como Bolívia e Chile ameaçam fazer o mesmo. O presidente Jair Bolsonaro tem nessa rebelião uma chance para reduzir seu isolamento mundial. Ele considerou o impacto de seu eleitorado vê-lo ao lado de Joe Biden, a figura mais poderosa do mundo, deixou o trumpismo de lado e decidiu comparecer.
De fato, a Nicarágua não é democrática – Daniel Ortega pôs seus adversários na cadeia e se tornou um tirano. Mas o tema que mais incomoda as nações latino-americanas, de profundo impacto eleitoral local, é a migração ilegal aos Estados Unidos, que continuam muitos duros em relação aos vizinhos, mesmo com os democratas na Casa Branca.
Um retrato disso é que a cúpula poderá ser cercada de grandes protestos em Los Angeles contra a política migratória americana. Cada país tem suas questões prioritárias, mas agora há mais disposição de discordar e pressionar os EUA. A fraqueza dos latino-americanos está longe de terminar e a maioria dos estados enfrenta pobreza, violência urbana e instituições enfraquecidas, com mais candidatos à tirania.
Há ainda o avanço do dinheiro chinês pela região.
O Brasil é o melhor exemplo no setor de commodities, faturando com a exportação de soja, petróleo e minério de ferro, além de receber injeção de recursos no segmento da energia elétrica. Mas o Brasil tem uma economia diversificada, que negocia também com outros polos comerciais do mundo. Já os outros países menores e médios da região almejam não depender dos EUA. É o caso do próprio México, que já chegou a ter 90% de suas exportações destinadas ao vizinho do norte.
A guerra da Ucrânia e a tensão com a China forçam uma atenção maior dos EUA com a América Latina. Ao invés dos EUA dependerem da produção chinesa, muitos países poderão ser novos fornecedores, o que não é simples. Faltam mão de obra capacitada, acesso às tecnologias e expertise de negócios.
Mas é da nova ordem mundial, com Rússia e China opostas ao Ocidente, que a América Latina pode se beneficiar. E o Brasil precisa saber avançar nesse contexto.