Coronavírus, presente e futuro

Especialistas apontam que a doença ainda terá um pico no Brasil, mas reforçam a baixa letalidade dela

Por: Da Redação  -  15/03/20  -  11:15
Atualizado em 15/03/20 - 11:40

Há crises relacionadas a problemas estruturais, como aconteceu em 2008, quando o sistema financeiro internacional foi abalado, causando efeitos negativos em todo o mundo que perduraram durante longo tempo. A pandemia do coronavírus, entretanto, envolve questão conjuntural: todos os especialistas e autoridades de saúde concordam que haverá um pico – o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, calcula que, no caso brasileiro, ele acontecerá em quatro meses – e, depois disso, a reversão se dará. Na China, onde a doença começou, tal fenômeno já é notado.


Há outro aspecto importante a destacar: a baixa letalidade do vírus. A grande maioria das pessoas infectadas desenvolverá formas benignas da doença, e muitas nem apresentarão sintomas, e é correto afirmar, como fez o médico infectologista do Hospital Sírio-Libanês, que o novo coronavírus não oferece riscos significativos às pessoas, uma vez que a doença não tem uma fração da gravidade que o imaginário popular acha.


Isso não significa, porém, que o assunto não deve merecer atenção e prioridade máxima. Medidas drásticas têm sido tomadas, como cancelamento de eventos e aglomerações, fechamento de escolas e planos de contingência. Isso justifica-se do ponto de vista de saúde pública, com o esforço para evitar a rápida propagação da doença, de modo que os serviços de saúde possam absorver toda a demanda.


É nesse ponto que reside o maior problema: a capacidade do sistema público atender a milhares de pessoas que vão procurar atendimento nos próximos dias e semanas, fato que irá acontecer e que pode trazer colapso em vários locais, prejudicando ainda a atenção e os cuidados com pacientes graves que têm outras enfermidades.


O Governo de São Paulo anunciou que trabalha com dois cenários para os próximos meses: um, mais otimista, indica que 1% da população do Estado será acometido pelo coronavírus; o outro, pessimista, aponta que 10% poderão ser infectados. Ou seja, na melhor das hipóteses, haverá 460 mil casos em São Paulo, número que pode crescer exponencialmente e chegar a 4,6 milhões de pessoas – 20% delas precisarão de cuidados médicos e isso significa de 100 mil a 1 milhão de indivíduos.


É preciso encarar o coronavírus com realismo, considerando os efeitos na economia. A queda nas bolsas de todo o mundo tem sido gigantesca, e a última quinta-feira foi o pior dia dos últimos 33 anos. As perdas financeiras têm sido enormes e o Ibovespa já registra queda próxima a 40% neste ano, a maior em 12 anos.


Não há dúvida de que as atividades econômicas são afetadas. As companhias aéreas e as agências de turismo foram as primeiras a ser atingidas: as ações da Gol já caíram mais de 70% em 2020, e o movimento aéreo e a demanda por pacotes de viagem baixaram de forma dramática.


Os efeitos negativos se propagam a outras atividades. Lazer, entretenimento e esportes também sentem as consequências do adiamento e cancelamento de eventos, com competições interrompidas (como foi o caso da Libertadores da América) e séria ameaça à realização dos Jogos Olímpicos de Tóquio. 


Cinemas, teatros, bares e restaurantes têm recebido menos público nos últimos dias. O comércio e os serviços, de maneira ampla, também começam a sentir a retração do consumo. As vendas são menores nas lojas e nos shoppings, e as empresas começam a se preocupar: sem faturar, continuam suportando custos fixos, como salários dos funcionários e encargos sociais, além de aluguéis e despesas com luz, água e telefone. Mesmo que haja liberação de financiamentos emergenciais, eles precisarão ser pagos no futuro, com juros.


Os grandes negócios, como a compra de imóveis ou mesmo de automóveis, tendem a ser paralisados, com os compradores se retraindo, à espera de definições no quadro econômico. A interrupção de atividades em escolas, universidades e até mesmo em empresas começa a acontecer e pode ser intensificada nos próximos dias. 


O governo brasileiro passou a anunciar medidas emergenciais, como a antecipação de metade do 13º salário para abril; a suspensão, por 120 dias, à prova de vida dos segurados do INSS e propôs a redução do teto dos juros do empréstimo consignado a favor dos beneficiários, bem como a ampliação do prazo máximo de operações. 


O discurso oficial tem sido de reforço das reformas estruturais, e o ministro da Economia, Paulo Guedes, apelou para a união do Executivo, Legislativo e Judiciário nesse momento de emergência. Nesse sentido, é necessário que as tensões sejam reduzidas, e o cancelamento das manifestações previstas para hoje em todo o Brasil é oportuno e necessário. Embora o próprio presidente Jair Bolsonaro, ao defender a ida às ruas há poucos dias, tenha salientado que não se tratava de ato contra o Congresso e Supremo Tribunal Federal e, sim, de ação pró-Brasil – é certo que haverá fortes críticas aos poderes e às suas lideranças, agravando o já difícil quadro político. 


Protestos e manifestações fazem parte da democracia. É legítimo que sejam organizados, mas é preciso refletir sobre sua conveniência, oportunidade e, principalmente, consequências. No atual momento, o confronto entre poderes e a radicalização política não interessam a ninguém e o futuro das reformas depende desse entendimento.


A crise será superada em poucos meses. Mas, até lá, as dificuldades serão enormes, exigindo ação firme dos governos, seja na saúde pública, seja para evitar o pior na economia, com efeitos negativos a toda a população. Reconhecer a gravidade da situação é fundamental, e a partir daí, sem pânico ou excessos, todos devem mobilizar-se para superá-la, com a determinação necessária. 


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