Caso seja preciso explicar

Ainda que inédita no alcance, a mudança nas Forças Armadas não é ameaça

Por: Da Redação  -  31/03/21  -  07:42

Não há motivos para crer que a troca de ministro da Defesa e a renúncia conjunta — ainda que inédita na história da República — dos comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica representem perigo à manutenção do regime democrático. São mudanças ao gosto do presidente da República, mas preferências de Jair Bolsonaro carecem de força para mudar o entendimento que as Forças Armadas consolidaram em seu âmago: o papel constitucional delas é defender a Pátria, e não, se impor à Nação.


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Temores ressurgiram porque o 31 de Março, hoje relembrado, foi o primeiro capítulo de um livro jamais fechado por completo. Por leniência de quem se escora na Lei da Anistia para minimizar excessos “dos dois lados”, essa história não terminou no enquadramento de quem cometeu crimes a serviço do Estado, cujo controle tomou sob estímulo de interesses privados.


Os líderes militares na ativa ou na reserva há tempo recente sabem, porém, que seu período de governar passou. Compreenderam que, por aspectos de sua ideologia, mais afeta ao respeito à hierarquia do que ao livre debate, foi preciso devolver o Brasil às mãos de civis eleitos pelo povo. Entre 1964 e 1985, o País produziu mais riquezas e industrializou-se, mas a repartição do bolo resultou em pratos vazios aos mais pobres. A desigualdade tem levado décadas para cair.


As Forças Armadas, portanto, pelo papel que desempenharam e pelo que lhes tem custado reerguer sua imagem, reconhecem que estão abaixo da Presidência da República, mas que a nação encima esses dois entes. E, na dúvida sobre qual proteger primeiro, virá o País.


Ademais, há limites para a satisfação de desejos particulares do comandante em chefe temporário. Não existe “meu Exército”, como quis dar a entender Bolsonaro em um de seus encontros públicos com apoiadores em Brasília, ao afirmar que não usaria as armas para impor medidas restritivas de alcance nacional na contenção da covid-19. É, aliás, inaceitável que um chefe de Executivo queira se utilizar de uma organização armada, mesmo que somente disparando notas pela internet, para reforçar críticas a decisões do Poder Judiciário das quais discorda, como a anulação das condenações de um adversário em potencial nas eleições do próximo ano.


O Exército e as outras forças são instituições de Estado e se sobrepõem a vontades particulares. Inclusive, se não especialmente, de um ex-militar aposentado à força por planejar atentados com explosivos em protesto por melhores vencimentos, conforme plano revelado à revista Veja e publicado na edição de 25 de outubro de 1987 e croquis expostos em 4 de novembro — numa referência a quem negar fatos.


Disciplinados, os líderes militares tendem a se recolher à quietude logo que passar a turbulência destes dias de reforma ministerial. Devem, porém, com sua discrição, deixar claro ao presidente que os constrangimentos jamais impostos a eles por um Governo terão limite.


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