Autonomia pelo bem da saúde

A autonomia da Anvisa se consolida em pleno governo que desrespeita instituições e impõe adesismos

Por: Redação  -  13/05/21  -  10:23
 Presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres
Presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres   Foto: Reprodução

O depoimento do presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres, à CPI da Covid, na terça-feira, não era dos mais esperados, mas até o momento está entre os mais impressionantes. Além de escancarar a discordância com o Palácio do Planalto em relação ao coronavírus, Barra Torres mostrou que a autonomia da agência reguladora se consolida em pleno governo que desrespeita instituições e impõe adesismos fiscalizados por uma militância ideológica das redes sociais. O que dá brilho à fala independente do chefe da Anvisa é de que ele, um contra-almirante (e médico), foi indicado ao cargo pelo presidente Jair Bolsonaro.


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Diz-se que Bolsonaro ficou tão aborrecido com o depoimento que não quis discursar em cerimônia de repasse de R$ 900 milhões no enfrentamento ao coronavírus. A análise é de que houve um abalo no Palácio com tamanha independência do indicado, que até lamentou aos senadores da CPI ter participado sem máscara em 15 de março de 2020, ao lado do presidente, de manifestação antidemocrática. “Se eu pensasse cinco minutos, teria feito diferente”, afirmou à CPI.


O comportamento de Barra Torres na CPI é da maior importância tanto para fortalecer o princípio de autonomia das agências reguladoras como para as mais recentes ou futuras tarefas da própria Anvisa. Por exemplo, a Anvisa enfrenta forte pressão por ter negado autorização ao imunizante russo Sputnik. A decisão irritou governadores e prefeitos da situação ou da oposição, da diplomacia de Moscou e da iniciativa privada que há tempos tenta produzir o imunizante no Brasil. Os critérios podem ser até questionados assim como a falta da urgência da Anvisa de atender uma crise sanitária, mas Barra Torres alegou que seguiu passo a passo os princípios técnicos de regulação do órgão e que eles precisam ser atendidos. Há alguns meses, até se tentou no Congresso, por pressão de governistas, sob liderança de Ricardo Barros (Progressistas-PR), mudar a legislação para flexibilizar a autoridade da Anvisa na liberação de vacinas, o que não avançou.


A autonomia do presidente da Anvisa é de extrema importância para reforçar os caminhos absurdos, infestados pelo negacionismo e contrariedades à ciência, que o governo tomou frente à pandemia. O contra-almirante disse claramente à CPI que a população não deve seguir as orientações de Bolsonaro sobre a covid-19, pois faz “guerra política” com o assunto - o que equivale dizer que o presidente busca vantagem política ao invés de priorizar a saúde pública. Barra Torres complementou ainda que a forma como o chefe do Planalto conduz a crise sanitária põe em risco a saúde dos brasileiros. No final das contas, deixou explícita a divergência total com o presidente.


Nada mais diferente do que fez o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, que contrariou afirmações anteriores em obediência ao chefe e se omitiu, na CPI, de falar sobre o que pensa em relação à cloroquina.


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