A pobreza após a morte dos idosos

De 301 mil idosos que morreram de covid, o estudo do Ipea estima que 165 mil sustentavam 314 mil parentes

Por: Redação  -  19/05/21  -  09:06
 Vírus tirou a vida de muitos idosos do país
Vírus tirou a vida de muitos idosos do país   Foto: Divulgação

Quando se observa o impacto da covid-19 na economia, a primeira imagem que se tem é do desemprego e dos negócios fechados. Porém, há uma outra situação bem grave, que inclui o social e o afetivo e carrega elevadíssimo potencial de empobrecimento. Trata-se da morte dos idosos, cujas aposentadorias ou pensões ou rendas complementares sustentavam suas famílias. Estudo da economista especializada em Terceira Idade do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Ana Amélia Camarano, publicado pelo jornal Valor na semana passada, dá o tamanho assustador dessas perdas. Após cruzamento dos registros civis com a renda média de 2019 da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílio (Pnad) do IBGE e Valor Data, os 301 mil maiores de 60 anos que morreram de covid-19 até abril (de um total de 401 mil no dia 30 no País) tiraram R$ 3,8 bilhões da economia.


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Esse valor equivale a 1,3% da massa salarial de R$ 294,4 bilhões do País e mostra o acerto da prioridade da vacinação dos mais velhos. O problema é que, após 13 meses da doença, a destruição socioeconômica dessas famílias já está consumada. Dessa forma, conclui-se que o negacionismo, que retardou a compra de imunizantes, foi um erro científico e econômico sem precedentes. Os mais idosos foram os primeiros a serem vacinados, mas uma parcela dos maiores de 60 anos ainda não tinha sido imunizada até abril. Acima dos 60, a covid matou apenas em março e abril 101 mil idosos.


A Previdência Social teria sido compensada pelos benefícios encerrados pelos óbitos, mas só se essa instituição for observada sob o aspecto de conta pública. Mas ela tem importância pela redução da pobreza após sua universalização na Constituição de 1988, lembrou a pesquisadora. Três décadas depois, o idoso ganhou peso nos novos arranjos familiares, com avós morando com filhos e netos, incluindo agregados, como cônjuges e enteados. Há ainda os nem-nem (não estuda nem trabalha) dos 19 aos 29 anos e, mais recentemente, dos 50 aos 59, trabalhadores de difícil reinserção após demissões em massa nos últimos anos.


O estudo de Ana Amélia Camarano aponta que cada idoso morto pela doença reduz em 48% a renda per capita da família. Quando a perda é de adulto mais jovem, o impacto é de 43%. Conforme a pesquisa, dos 301 mil óbitos, estima-se que efetivamente 165 mil sustentavam 314 mil parentes.


O estudo dá o devido retrato desse empobrecimento, que não desaparecerá pela simples reabertura da economia. Para atenuar esse impacto, será preciso gerar empregos para esses familiares recomporem a renda perdida. Isso vai demandar um maior consumo para fazer as empresas crescerem e requalificar desempregados, inclusive os nem-nem. Isso exigirá tempo e maior qualidade da educação, lembrando que a tecnologia está mudando a natureza dos empregos. Se for realizado, esse trabalho será enorme.


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