A escalada dos juros básicos
Setor público precisa fazer a tarefa de casa, que é evitar incendiar ainda mais a inflação, mantendo-se austero
O aumento dos juros básicos da economia em um ponto percentual, para 6,25% ao ano, foi considerado moderado por analistas, pois alguns chegaram a prever alta de até 1,50. Já o Comitê de Política Monetária (Copom), após anunciar a nova Selic, alegou que precisa observar a adequação das atividades econômicas à escalada recente da taxa. Em resumo, o Banco Central está preocupado com a possibilidade da calibragem dos juros começar a anular os efeitos da reabertura com o avanço da vacinação contra a covid-19. Por outro lado, o BC mantém alguma esperança da inflação, pelo menos em parte, ser logo debelada. Mas o resultado prático de subir a Selic é encarecer o custo do dinheiro - o crédito fica mais caro para investir, comprar a casa própria e consumir no comércio – e desestimular a demanda para forçar uma queda de preços. Essa estratégia não tem como não abater o setor produtivo e o consumo. Porém, uma característica histórica dessa política monetária é o seu resultado demorar um pouco a aparecer, talvez daqui a seis meses.
Desta vez, o trabalho do BC está mais difícil e, conforme a autoridade monetária explicou, os fatores inflacionários são internos e externos e se interagem. Os estímulos monetários contra a pandemia, como o auxílio emergencial, ampliando o consumo de alimentos e alguns produtos industrializados, coincidiram com a queda na oferta de commodities alimentícias e minerais e no atraso das indústrias de insumos, como os microchips dos automóveis.
Há ainda a reabertura das economias pelo mundo, mas de intensidade e períodos diferentes – primeiro na Europa e Estados Unidos, agora com revés na Ásia devido à variante Delta e sabe-se lá quando na América Latina e África.
O Brasil tem seus próprios fatores da disparada dos preços, como a memória inflacionária - uma série de mecanismos previstos em contratos ou até culturais que mantém os reajustes quase automaticamente deflagrados por mais tempo, uma herança dos anos 1980. Há ainda a tentação do gasto público em época próxima das eleições, quando o governo, para se reeleger, despeja muito dinheiro para seus redutos de votos, atenuando os efeitos da subida dos juros e prolongando o fôlego da inflação. Algo visto no Governo Dilma Rousseff perto do fim do primeiro mandato por meio dos programas de transferência de renda.
Os analistas do mercado consultados pelo BC preveem inflação pouco abaixo de 9% em dezembro e ficando por volta de 8% no próximo ano, caindo apenas em 2023. Os impactos econômicos da pandemia devem continuar na parte da oferta, mas há uma possibilidade dos juros altos debelarem a contaminação inflacionária nos diversos setores, afinal o pífio crescimento do País e o desemprego desestimulam qualquer empurrão no consumo. E o setor público precisa fazer a tarefa de casa, que é evitar incendiar a inflação, mantendo-se austero. Não há outro caminho.