Presidente da Clia Brasil defende cruzeiros o ano todo e analisa desestatização do Porto de Santos

Em entrevista para A Tribuna, Marco Ferraz demonstra preocupação com a privatização da gestão do cais santista

Por: Ágata Luz  -  10/04/22  -  17:45
Marco Ferraz está otimista com a próxima temporada de cruzeiros
Marco Ferraz está otimista com a próxima temporada de cruzeiros   Foto: Ágata Luz/AT

Uma temporada de cruzeiros durando o ano todo e atraindo ainda mais companhias ao Brasil. Este é um desejo do presidente da Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos (Clia Brasil), Marco Ferraz. Em entrevista para A Tribuna, ele se diz otimista com as viagens de navio no Brasil e revela inovações que podem levar as embarcações a operarem, inclusive, no Rio Amazonas. Já em relação ao Porto de Santos, ele revela preocupação com alguns pontos do processo de desestatização.


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Como foi o processo de retomada da temporada de cruzeiros na temporada 2021/2022?

Após dois meses de suspensão, a gente teve a retomada em 5 de março. Foram confirmados quatro navios nessa retomada. Destes, dois tiveram um período curto de circulação. Um navio ficou uma semana, outro permaneceu no Brasil por mais duas semanas e o terceiro, que deixou o Porto de Santos na última quinta-feira, ficou operando por praticamente um mês. O quarto navio, por fim, irá embora no dia 22 de abril.


E como a Clia avalia este período?

A gente ficou bem contente com a volta, pois é importante retornar e mostrar a segurança da operação, que a experiência de viagem continua fantástica e, assim, contribuir para economia, com geração de empregos. Em Santos, navios chegaram e saíram com muitos tripulantes, havia sete mil a bordo. A demonstração foi boa e, agora, a gente teve quase dois meses de operação. Nos primeiros cruzeiros, a gente estava com uma ocupação um pouco menor, mas já com o público e agentes de viagem vendo que as operações estavam seguindo tranquilas, esses últimos cruzeiros estão mais movimentados, sempre seguindo os protocolos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).


Durante esta retomada, qual foi o feedback do público?

O que a gente escuta dos agentes de viagem, dos hóspedes e dos nossos associados é que está sendo um sucesso, a operação está sendo muito tranquila e prazerosa. Estamos mostrando para nossos hóspedes essa experiência fantástica de navegar, acordar cada dia em um destino e ter tudo junto: hospedagem, gastronomia, entretenimento, transporte. O feedback é muito positivo.


O que as empresas de cruzeiros preparam para a temporada 2022/2023?

Estamos felizes por haver oito navios confirmados para próxima temporada. São cinco da MSC e três da Costa Cruzeiros. A gente voltará a fazer os cruzeiros internacionais, que não foram realizados nesta temporada. Haverá um navio se deslocando para o Brasil com argentinos e uruguaios e temos navios que vão daqui para lá também, além de todos os cruzeiros no Brasil que a gente mantém. Vão ser 14 destinos e a gente ainda está discutindo possibilidade de algum outro novo. Os números são muito fortes, a gente volta com um número maior do que na temporada 2019/ 2020 e se aproximando de 680 mil leitos ofertados.


Há armadores que hoje não operam cruzeiros no Brasil e procuraram a Clia ou têm interesse em vir para o País na temporada 2022/2023?

Sim, o Brasil é visitado por cerca de 14 companhias, além dessas duas que fazem operação aqui. Elas estão dando volta ao mundo, se posicionando lá no sul da Argentina e Chile para visitarem a Antártica e passam por aqui, já tendo essa degustação do que é operar no Brasil. Além delas, há outras companhias e a Clia, por ser uma associação internacional com 56 armadoras, sendo 42 de oceano, consegue transmitir dentro da associação todas as informações. Um dado importante é que a gente tem 93 novos navios que vão ficar prontos até 2027. Essas embarcações que vão começar a operar precisam de destinos e a gente está sempre levantando a mão querendo esses navios aqui.


Como o senhor avalia os dois meses de paralisação dos cruzeiros no Brasil, entre janeiro e março?

O golpe foi muito grande. É um setor que foi fortemente afetado pela pandemia desde 2020. Ficamos 100% parados. Trata-se de um prejuízo grande não só para companhias, mas para todos que vivem dos navios de cruzeiros, como tripulantes, agentes de viagem, operadoras e o setor receptivo, desde o vendedor de coco até o transporte local, como táxis e vans. Mas as empresas mostraram sua força e estamos felizes de poder voltar, mostrar o Brasil para os hóspedes e voltar a gerar impacto econômico e social.


Este período de suspensão pode ter afastado algumas empresas para a próxima temporada no Brasil?

No momento, não. A gente não vê nenhuma empresa que deixou de vir para o Brasil por algum motivo. Agora estamos com as fronteiras abertas, tudo correndo bem com a pandemia, a nova temporada vai acontecer e acredito que terá muito sucesso no País.


No fim do ano passado, o agora ex-ministro do Turismo, Gilson Machado, falou que o Governo Federal trabalhava com ideia de não ter apenas uma temporada para os cruzeiros, pois enxerga potencial para o ano todo. A Clia concorda?

A gente concorda com ele, pois gostaríamos de ter navios de cruzeiro o ano inteiro. O Brasil possui potencial para isso, tem demanda e a oferta a gente poderia adaptar. Há o Nordeste com grande potencial para atrair não só os americanos, como os europeus e sul-americanos para conhecerem o Brasil o ano inteiro. E o Brasil tem o Amazonas, que é um rio grande, com profundidade suficiente para entrarem, inclusive, os navios de oceano que a gente tem. Alguns já visitam o Amazonas e a gente está trabalhando para isso. Temos desafios de infraestrutura, custos, impostos - a carga é bem elevada - e regulação, pois é um setor altamente regulado.


E isso é possível?

Com o aumento de números de navios, ampliamos as possibilidades de atrair cruzeiros o ano inteiro. Nas últimas temporadas, a gente vem aumentando o período que os navios ficam. Na próxima temporada, teremos 176 dias de operação, ou seja, estamos chegando aos seis meses. Se crescermos devagarzinho, podemos ter navios o ano inteiro em um futuro breve.


Em Santos, a infraestrutura destinada aos cruzeiros é muito debatida. Como a Clia vê este assunto? Levar o Terminal de Passageiros ao Valongo é positivo?

A gente não quer ficar sem operação. É muito importante não ter suspensão de operação. Mas precisamos de infraestrutura para atender bem aos nossos hóspedes. Se a mudança trouxer uma infraestrutura melhor, é claro que a gente é favorável. Hoje, os berços dos navios ficam longe dos terminais e a gente tem que passar por cima da via férrea, são questões que em outros países a gente não enfrenta. Porém, é o que nós temos, estamos conseguindo operar e não podemos ficar sem berços e infraestrutura enquanto um outro terminal não ficar pronto. Mas se ele tiver condições melhores e similares ao que a gente vê em outros países que estão investindo muito nisso, a gente é favorável.


A associação acompanha esse projeto?

Já tivemos conversas com o diretor-presidente Fernando Biral, da SPA (Santos Port Authority), que nos mostrou o projeto. Agora é uma questão de viabilização. Além disso, é preciso haver garantia de que a gente não vai ficar sem espaço para operação enquanto o outro não está pronto. Ele (Biral) já nos deu essa garantia de viva-voz, estamos mais tranquilos e seguimos acompanhando.


Em relação ao processo de desestatização do Porto de Santos, como a Clia se posiciona?

A gente tem conversado com o próprio presidente da SPA, o Ministério da Infraestrutura, o secretário nacional de Portos (Diogo Piloni) e sua equipe. É importante a garantia de atendimento de navios de cruzeiro e também que os custos portuários não explodam. Recebemos uma nova tabela que aumenta muito o custo portuário para cruzeiros e estamos em discussão com a SPA para entender esse aumento e chegar a um bom termo de operação dos navios de cruzeiro sem prejudicar o custo de operação aqui no Brasil. Ele já é alto e se tiver um aumento grande, a gente pode afugentar os navios. Esperamos continuar operando com condições favoráveis.


Quais seriam essas condições favoráveis a partir da desestatização?

A preparação da infraestrutura. Há navios que vêm com gás natural liquefeito e precisamos ter o Porto de Santos preparado para abastecê-los. Hoje, não está. Há navios prontos para ligar na energia elétrica do porto e quando o complexo santista contar com a capacidade de ligação, a gente também já tem tudo preparado. Com o Porto sendo privatizado, a gente espera que melhorias aconteçam e haja uma operação preparada para as tecnologias dos navios que estão vindo.


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