Frederico Bussinger: Qual o modelo portuário mais adequado para o Brasil?

Há desafios novos para planejamento, governança e regulação

Por: Frederico Bussinger  -  19/04/21  -  21:02
Frederico Bussinger: Qual o modelo portuário mais adequado para o Brasil?
Frederico Bussinger: Qual o modelo portuário mais adequado para o Brasil?   Foto: Ilustração: Padron

A Comissão de Viação e Transportes (CVT) da Câmara de Deputados realizou, ontem, audiência pública para discutir o tema que dá título ao artigo. A iniciativa deve ser saudada por serem cada vez mais raras discussões abertas e conclusivas sobre políticas públicas no País.


Veiculação de notícias de “privatização dos portos brasileiros” e que um tal “modelo australiano” seria nossa referência básica devem ter motivado a Comissão. O que está em pauta, porém, é a desestatização (privatização) das autoridades portuárias, pois as operações portuárias já são 100% privadas no Brasil há mais de 20 anos!


Há três caminhos na busca de respostas: um olhar para o mundo; para os desafios do Brasil futuro; e para nossas recentes experiências.


As pesquisas periódicas de “Governança Portuária”, da Associação Europeia de Portos - ESPO, abrangendo mais de 200 no continente, dão resposta abalizada. E ela é inequívoca: o modelo Landlord é o benchmarking internacional. A Austrália é uma das poucas exceções. Difícil, pois, entender-se o porquê ela foi escolhida como nossa estrela-guia!


A explicação dada, em geral, é que “o Brasil é diferente!”. “Aqui o modelo Landlord não funciona”. Será? O Brasil tem mais identidades com a Austrália ou com Portugal, Espanha, Argentina, Chile, Colômbia e México? Por que se rejeita modelo distinto do majoritário na China, USA e Europa, onde segundo a ESPO, “a esmagadora maioria das autoridades portuárias é pública”?


Duas explicações usuais: dificuldades de contratação no setor público (a famigerada Lei nº 8.666/93), e a “influência política nos portos”. Só que: i) a ESPO informa que “a influência política varia regionalmente, mas é substantiva por toda parte... se materializa através da indicação dos principais executivos e da composição dos conselhos”; ii) as profundas reformas sob a Lei nº 8.630/93 foram feitas também sob a 8.666/93... que, ademais, vem de ser revogada e substituída por outra moderna, destravante e focada em resultados, segundo juristas e gestores que vêm se manifestando.


Agora olhando para nosso futuro: que problemas precisamos e, principalmente, queremos resolver (particularmente nos portos públicos)? Não é difícil constatar-se que a pauta do que precisa ser resolvido hoje é bem diferente daquela dos anos 80/90, em alguns casos até antagônica. E com um aspecto novo: hoje há os “complexos portuários”, para os quais foram criados os “planos mestre”; mas ainda carecem de uma governança específica.


Em síntese, há desafios novos para planejamento, governança e regulação; no meio dos quais a eventual desestatização das autoridades portuárias acaba sendo apenas um dos inúmeros aspectos. E, certamente, não o principal.


Se o “modelo australiano” (mesmo o “ajustado”) é capaz de dar conta do recado, é difícil saber. O que pode ser afirmado, porém, é que é praticamente consenso que as maiores transformações nos portos brasileiros ocorreram sob a vigência do modelo balizado pela Lei nº 8.630; incidentalmente, o mais próximo do landlordismo que o Brasil já teve. Coincidência? Pode ser! Há outros fatores? Certamente! Mas difícil negá-lo: ele “mostrou serviço”.


Enfim, quer olhemos para o mundo, quer olhemos para os desafios futuros, quer nos espelhemos em nossas experiências do passado recente, o mais prudente seria nos alinhamos ao benchmarking internacional para os portos públicos: landlord, com gestão descentralizada, autônoma e participativa, e sob comando de instâncias públicas. Evidentemente profissionalizadas.


(*) Síntese da intervenção do autor na Audiência da CVT.


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