Frederico Bussinger: Golpe de mesTREM

“Diferentemente da geometria, em política a menor distância entre dois pontos nem sempre é uma linha reta"

Por: Frederico Bussinger  -  15/10/21  -  06:49
  Foto: Arquivo

Caso-1: Chegar ao norte de Mato Grosso (MT) é sonho antigo da Rumo. Fora abandonado em 2010 quando a ALL devolveu quatro trechos da concessão. Ele foi resgatado em 2016, no contexto da renovação antecipada da Malha Paulista. Antevia-se clima favorável, há um ano, quando a Rumo antecipou à União R$ 5,1 bi de outorgas. Mas, no início de MAR/21, a notícia de que o Ministério da Infraestrutura (Minfra) poderia licitá-lo jogou por terra a esperança de ter a extensão via aditivo.


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Lei estadual, mais ou menos dessa época, regrou ferrovia por autorização em MT. Em julho seu governo lançou "chamamento público" para duas extensões, a partir de Rondonópolis: Cuiabá e Lucas do Rio Verde. Em 3/SET foi apresentada uma única proposta; em 13/SET (habilitada); e em 20/SET a Rumo assinou o contrato.


Funcionalmente, os dois trechos são, na prática, extensões das malhas sob concessão federal. Mas como o Minfra ofereceria resistência à iniciativa, se: i) a RUMO tornou-se "parceira" logo no 1º leilão (da FNS), contribuindo para trazer Minfra e Ministro ao primeiro plano da Esplanada? ii) Se ela antecipou pagamento de outorgas (R$ 5,1 bi)? iii) Se o Minfra vem sendo o grande promotor do modelo de ferrovias por autorização?


Caso-2: Nessa cruzada, inclusive, encampou o PLS-261/2018; apresentado por um PSDBista (Sen. José Serra/SP) e relatado por um PTista (Sen. Jean Paul Prates/RN). Mesmo assim baixou a MP nº 1.065, de teor similar ao do PLS.


Senadores, ressentidos, cogitaram devolver a MP. O Minfra, então, dobrou a aposta: promoveu cerimônia (2/SET) no Planalto para anunciar o "Pro Trilhos" e já divulgar 10 pedidos de autorização (hoje já são 19).


Se MP e cerimônia tiveram influência, é difícil afirmar. O certo é que a MP não foi devolvida; o PLS foi logo pautado e, em 5/OUT, aprovado pelo Plenário do Senado (com entusiasmado apoio pluripartidário): agora, segue para a Câmara. Ao fim e ao cabo o presidente Rodrigo Pacheco (DEM/MG) conseguiu sair da "sinuca de bico" e o ministro Tarcísio, ter uma andorinha na mão e outra voando.


Caso-3: VLI e depois Rumo, vislumbrando oportunidade para não mais depender da "Ferradura" da MRS (acesso obrigatório ao Complexo Portuário de Santos), se habilitaram para implantar na região “shortlines” (uma impropriedade, pois o conceito não se aplica a trechos ferroviários com funções tão estratégicas).


A perspectiva de três acessos independentes, além de certamente aumentar o imbróglio, já agora na ordem do dia, vai na contramão de experiências articuladoras em Chicago-USA ("Chicago Ring") e no Porto de Rotterdam ("Betuwe Line" e RSC - empresa para organizar as composições de todos os operadores). E, mais amplamente, da Europa, que busca materializar uma política e um plano (TEN-T) para eliminar descontinuidades (de infraestruturas), remover gargalos e fortalecer a coesão continental.


Dificilmente as duas novas "Ferraduras" serão viabilizadas. Mas as iniciativas muito provavelmente: i) levarão a MRS à mesa de negociação; ii) acelerarão a renovação antecipada da MRS; e iii) fortalecerá a ideia de uma malha unificada da Baixada Santista, sob comando unificado: única solução racional e sustentável.


Em síntese, esses três recentes casos indicam que o desenvolvimento da infraestrutura logística brasileira vai muito além de planos nacionais, profusão de dados, algoritmos, elaboradas projeções oraculares, EVTEAs, etc, etc. Lembrando Guimarães Rosa; “há mais coisas no ar que os aviões da Panair”.


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