De Popa a proa: Logística de contêineres, pandemia e choque de demanda

Caio Morel é Consultor técnico da Associação Brasileira de Terminais de Conteineres (Abratec)

Por: Caio Morel  -  13/11/21  -  10:55
  Foto: Matheus Tagé/AT

Todos já sabemos o que ocorreu: a pandemia mudou o padrão consumo de todos nós. Cortamos gastos no lazer como viagens e restaurantes, e passamos a comprar produtos on-line pois as lojas estavam fechadas. Esta mudança no padrão de consumo causou grande aumento na demanda de transporte, pois os produtos passaram a ser entregues na porta de nossas casas. Muitos destes produtos são importados ou possuem componentes importados em sua fabricação, aumentando a quantidade de contêineres transportados entre portos de todo o globo. Este aumento de demanda de transporte foi significativo e não previsto, causando congestionamento nos terminais de contêineres, fila de navios aguardando atracação, falta de disponibilidade de contêineres gerando aumento no preço dos fretes e dos custos de manuseio e armazenagem de cargas.


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Contrariando um axioma da ciência econômica, o aumento do custo logístico não diminuiu (ainda) a demanda, que segue aquecida, mantendo a pressão sobre o sistema global de transporte de contêineres, que continua operando com volumes crescentes, portos congestionados e preços altos. No Brasil, a exportação cresceu 9,8% em 2021 em relação a 2019, período pré-pandemia. E a importação, pasmem: cresceu 15,8%. E este crescimento forte não deve arrefecer. Segundo dados do FMI, deverá haver um aumento global de contêineres de 18% no período de 2021 a 2024, enquanto a frota de navios porta contêineres deverá crescer 14%, mantendo o mercado em choque positivo de demanda, ou seja, a procura de serviços logísticos deverá continuar acima da oferta.


Pela primeira vez na história, o custo logístico foi o vilão do processo inflacionário, particularmente na economia americana, que verificou em 2021 o maior índice em 31 anos, segundo o New York Times.


Como se trata de um desequilíbrio entre demanda e oferta causado por mudança no padrão de consumo, somente as forças de mercado poderão reestabelecer o equilíbrio. Qualquer intervenção regulatória no processo será um desastre, aumentando o desequilíbrio e tornando mais distante a volta à normalidade, que deverá ser, entretanto, um novo normal, com a obtenção de um novo ponto de equilíbrio entre demanda e oferta.


Chamado a agir, o governo do Presidente Biden concluiu que pouco pode ser feito no curto prazo, mas muito deve ser feito no médio prazo. No curto prazo, a conclusão foi de que se deve deixar o mercado agir, com os transportadores marítimos, terminais portuários, importadores e exportadores tomando as medidas necessárias para que se alcance um reequilíbrio eficiente.


A única medida concreta tomada até então pelo governo americano foi determinar que o porto de Los Angeles passasse a operar 24 horas por dia, medida óbvia e desnecessária no Brasil, onde todos os nossos portos já operam nesta condição.


Já no médio prazo, muito investimento em infraestrutura para aumentar a capacidade nos portos. Os Estados Unidos saem na frente com a recente aprovação de um pacote de infraestrutura de 1,3 bilhão de dólares, onde investimentos em portos terão lugar de destaque.


Armadores já estão revendo encomendas para a construção de novos navios porta contêineres da classe “ULCS – Ultra Large Containerships”, ponto de partida uma nova corrida na construção de navios.


No Brasil, a maior providência a ser tomada é adaptar nossos portos para o recebimento de navios maiores. Precisamos atingir uma profundidade de 17 metros na maioria de nossos portos que estão engajados no transporte de contêineres, para podermos auferir as economias de escala desta nova onda de encomendas. A disponibilidade da infraestrutura portuária necessária certamente irá fomentar novos investimentos privados em terminais de contêineres, equipando nosso país a enfrentar os desafios do crescimento do comércio global.


E para atravessar este período de crise que não sabemos ainda quando termina, vamos deixar a cargo dos transportadores marítimos, operadores dos terminais de contêineres, importadores e exportadores a tomada das medidas necessárias e possíveis até que seja alcançado o novo equilíbrio.


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