Novo Imposto de Renda proposto pelo Governo eleva carga, dizem especialistas

Projeto corrige faixa de isenção, mas restringe desconto simplificado, prejudica contrato de PJ e taxa dividendo

Por: Júnior Batista  -  11/07/21  -  19:17
  Guedes (dir.) entrega projeto do IR de autoria do Executivo: votação precisa ser rápida para valer em 2022
Guedes (dir.) entrega projeto do IR de autoria do Executivo: votação precisa ser rápida para valer em 2022   Foto: Gabriela Biló/Estadão Conteúdo - 26/06/21

Encaminhado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes à Câmara, no último dia 25, o projeto da reforma do Imposto de Renda (IR) aumentará a carga tributária de trabalhadores e empresas, na visão de especialistas ouvidos por A Tribuna. Em entrevistas, Guedes já negou a intenção de elevar o tributo de uma forma geral.


A proposta já está com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Ela prevê a entrada em vigor no próximo dia 1o de janeiro. No entanto, precisa ser votada ainda neste ano.


Entre as mudanças, o teto para optar pela declaração simplificada e a criação de uma tributação sobre lucros e dividendos são os temas com mais críticas.


Para o doutor em Contabilidade pela Universidade de São Paulo (USP) e professor do mestrado em Ciências Contábeis da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap), Tiago Nascimento Borges Slavov, a reforma é singela e com muitos agravantes. “Com a mudança do desconto simplificado, a maioria das pessoas perderá parte de suas restituições”.


Segundo a Receita Federal, dos 30,5 milhões de contribuintes no ano passado, 57,2% escolheram a versão simplificada na hora de mandar a declaração. “Isso, por si só, traria muito impacto, porque há um argumento falacioso de que vai estimular a pedir nota fiscal nas compras, mas muitos gastos não são dedutíveis na declaração de imposto de renda”, justifica.


Slavov exemplifica que, em países desenvolvidos, há mais deduções, citando exemplos de compras de livros, materiais escolares e gastos com transporte, diferentemente do Brasil.


Lucros e dividendos


Do lado das empresas, o ponto que traz mais polêmicas é a tributação de 20% sobre lucros e dividendos acima de R$ 20 mil.


A previsão do Governo Federal é que esse dispositivo acrescente R$ 18,5 bilhões à arrecadação, em 2022, e R$ 58,1 bilhões, em 2024.


Para Slavov, na prática, quem trabalha hoje na modalidade de pessoa jurídica (PJ) vai tentar retornar à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT, regime com carteira). “Ele (contrato como PJ) atinge esse trabalhador em cheio, porque ele vai pagar tributo na pessoa jurídica, se passar dos R$ 20 mil e na física novamente. Ou seja, ele vai pagar duas vezes”, diz.


Na opinião de Slavov, como os encargos para contratar via CLT continuam caros, o profissional que era PJ tentará ser registrado, porém, vai receber menos.


Para o economista e diretor comercial e de parceiros da startup de soluções fiscais Dootax, Yvon Gaillard, é preciso ver o tema com cautela. “Temos o lado empresarial que é contra e algumas classes sociais e sindicais, que o defendem (o projeto) por uma questão sobre a igualdade tributária. Precisamos ver o tema com amplitude, ressaltar que precisamos de uma reforma tributária maior”.


Alíquota do IRPJ


Na outra ponta, o Governo diminui, até 2023, de 15% para 10% o Imposto de Renda das empresas.


Para Gaillard, a União propõe reduzir a alíquota de Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), mas a diferença dos dividendos vai deixar a conta mais cara para os empresários. “Na prática, o que o Governo está fazendo é criar um adicional sobre a distribuição de lucro, com uma fonte de arrecadação maior”, aponta.


Os dois especialistas afirmam que o governo quer aumentar arrecadação e melhorar os índices de emprego (por conta das contratações CLT), pois “o emprego formal dá esse aspecto de melhora na economia”, diz Slavov.


Regra do imóvel: futuros governos perdem


O Governo Federal também propôs reduzir a alíquota do IR sobre ganhos de capital de 5% sobre a venda de imóvel, caso o contribuinte atualize o valor da propriedade.


Hoje a alíquota é de 15%, mas sobre o lucro na venda. Com a nova regra, será possível fazer uma declaração dizendo quanto o imóvel vale e pagar 5% sobre esse preço, ficando isento quando for vender.


Para o professor Tiago Slavov, essa mudança vai gerar caixa de imediato, mas prejudicará a receita futura. “O Governo abre mão de dois terços da arrecadação futura, o que leva à melhora no curtíssimo prazo, comprometendo o futuro”, aponta.


Ele afirma que a solução seria reduzir o gasto público, o que, no cenário de recuperação pós-pandemia, não deve ocorrer, com rombo para futuros governos.


O economista Yvon Gaillard diz que a reforma foi feita para aumentar a arrecadação imediata. “O Brasil precisa de uma reforma tributária ampla, em consumo, na questão trabalhista e patrimonial”.


O que Guedes propôs


FAIXA DO IR


Como é hoje

Faixa 1 – Até R$ 1.903,98: isento



Faixa 2 – De R$ 1.903,99 até R$ 2.826,65: 7,5%


Faixa 3 – De R$ 2.826,66 até R$ 3.751,05: 15%


Faixa 4 – De R$ 3.751,06 até R$ 4.664,68: 22,5%


Faixa 5 – Acima de R$ 4.664,68: 27,5%


Proposta


Faixa 1 - até R$ 2.500: isento


Faixa 2 - De R$ 2.500,01 até R$ 3.200: 7,5%


Faixa 3 - R$ 3.200,01 até R$ 4.250: 15%


Faixa 4 - R$ 4.250,01 até R$ 5.300: 22,5%


Faixa 5 - Acima de R$ 5.300,01: 27,5%


IR DAS EMPRESAS


Como é hoje


15% e não há cobranças adicionais.


Proposta


Menos 2,5 pontos percentuais em 2022 (para 12,5%) e mais 2,5 pontos percentuais a partir de 2023, chegando a 10%; além disso, alíquota adicional de 10% para lucros acima de R$ 20 mil por mês.


LUCROS E DIVIDENDOS


Como é hoje


Não há cobrança.


Proposta


20% na fonte, com isenção de até R$ 20 mil por mês para microempresas e empresas de pequeno porte.


GANHOS COM IMÓVEIS


Como é hoje


Alíquota de 15% e 22,5% e a incidência ocorre quando o contribuinte vende ou transfere a posse do imóvel.


Proposta


Contribuinte tem a opção de pagar 5% na atualização do valor do imóvel, que deve ser feito entre janeiro e abril de 2022.


APLICAÇÕES FINANCEIRAS


Como é hoje


alíquota de 15% na renda variável, em mercados à vista, a termo, opções e de futuro e de 20% em day trade (venda no mesmo dia) e cotas de Fundos de Investimento Imobiliário (FII). Na renda fixa, as taxas variam de 15% a 22,5%, mas só são cobrados em retiradas a partir de 720 dias.


Proposta


Unificação em 15% para renda fixa e para renda variável, como mercado acionário à vista e day trade.


RENDIMENTOS DE FUNDOS IMOBILIÁRIOS


Como é hoje


Rendimentos pagos aos cotistas são isentos.


Proposta


Alíquota de 15%, independentemente do tipo de FII.


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