Conexão Portugal: Touradas no centro das atenções

Nesta edição da coluna, Luiz Plácido fala sobre a cultura medieval que permanece até os dias atuais no país

Por: Luiz Plácido - De Coimbra  -  11/07/19  -  23:48

Algumas tradições na Europa, em especial em Portugal, teimam em permanecer nos dias de hoje. Tudo bem que tradições são para serem mantidas, para serem passadas de geração para geração, mas algumas devem evoluir e outras, até mesmo acabar. É o caso das touradas, que em pleno século XXI ainda são chamadas de “espetáculo” e, por vezes, transmitidas em horário nobre por emissora de televisão estatal, como é o caso da RTP (Rádio e Televisão de Portugal). Em 2017, as três corridas transmitidas pela emissora obtiveram cerca de 2 milhões de telespectadores. 


São, ao todo, mais de 70 praças de touros espalhadas por Portugal, que recebem em média meio milhão de telespectadores por ano. A grande maioria das arenas pertence às santas casas de Misericórdia, as principais instituições de solidariedade do país. Outras pertencem ainda ao IPSS (Instituições Públicas de Solidariedade Social). E a maior parte da renda gerada nas touradas ajuda a financiar as atividades dessas instituições. 


Muitos portugueses defendem ainda a tourada como forma de identidade nacional. Em Portugal, existem três tipos de corridas de touro dentro das arenas, a Lide a Pé, a mais tradicional, onde um homem com pano vermelho desafia o touro; os Forcados, com oito homens tentando segurar um touro com as mãos; e a Lide a Cavalo, onde o toureiro montado a cavalo tem um tempo para espetar farpas afiadas no dorso do animal. Desde 1840 é proibido matar o touro em Portugal.


O problema é que, por vezes, nem tudo sai como o planejado. E o que se vê dentro da arena é um espetáculo de brutalidade e violência, como foi o caso da corrida de Coruche, vila do distrito de Santarém, onde uma tourada acabou mal no último sábado, dia 6. As imagens chocaram o país e trouxeram à tona o debate sobre o fim das touradas.


No evento, cinco forcados e dois cavaleiros foram colhidos pelos touros e precisaram ser hospitalizados. Todos já estão fora de perigo e passam bem. A mesma sorte não teve um dos cavalos, que foi pego pelo touro e teve que ser sacrificado, revoltando parte da população e defensores dos direitos dos animais, caso da PAN (Pessoas Animais Natureza), que pediu esclarecimentos ao Ministro da Agricultura sobre a morte do animal e a falta de um veterinário no local para o pronto atendimento, uma vez o cavalo não foi imediatamente socorrido. 


Uma petição pública que pede a abolição das touradas e de todos os espetáculos com touros em Portugal foi criada após o incidente e já conta com cerca de 75 mil assinaturas. 


Algumas cidades já vem enfrentando uma pressão maior pela abolição das corridas de touro. É o caso de Coimbra, que no ano passado decidiu, através de plebiscito entre os alunos, acabar com a garraiada, tradição que era secular durante a festa de formatura da Queima das Fitas. Votaram ao todo 5.638 alunos, de um universo de 25 mil estudantes. 70,7% votaram pela abolição da prática, contra 26,7% que votaram pela permanência. O resultado gerou revolta, mas foi mantido pelos veteranos da universidade.


A Universidade do Porto tinha tomado tal decisão em 2016, ao extinguir a prática. Outra cidade que aderiu ao fim das touradas foi Póvoa de Varzim, ao Norte. Continuamos na torcida para que práticas medievais como esta sejam extintas do nosso dia a dia.


Autor - Luiz Plácido é jornalista, apresentador do programa Destino Portugal (transmitido no canal de tv a cabo Travel Box Brazil) e proprietário da agência de turismo Destino Portugal Viagens. Ele escreve na coluna Conexão quinzenalmente, às quintas-feiras.


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