Conexão Portugal: Os incêndios voltaram

Nesta edição da coluna, Luiz Plácido relembra o maior incêndio florestal da história do país e aborda do cenário atual está parecido ao da tragédia

Por: Luiz Plácido - De Coimbra  -  30/07/19  -  19:40

17 de junho de 2017. Em mais uma tarde de verão intenso daquele ano, no concelho de Pedrógão Grande, no distrito de Leiria, um grande incêndio florestal devastava tudo o que tinha pela frente, se alastrando por concelhos vizinhos e pegando de surpresa famílias que saíam de um conjunto de piscinas que acabara de encerrar as atividades naquele dia. 66 pessoas morreram carbonizadas e 254 ficaram feridas em decorrência daquele que foi o maior incêndio florestal da história de Portugal. 


O país se sensibilizou. Todos os canais de televisão transmitiam direto aquela tragédia. E políticos prometiam medidas enérgicas para acabar com a rotina de incêndios florestais que todo ano assola o país durante os meses mais quentes.


E o que mudou de lá para cá? Nada, ou quase nada. Nesta última semana, os incêndios voltaram na região central do país com grande força.


Mas por que todo ano é a mesma coisa? Por que Portugal arde tanto com os incêndios florestais? A resposta é simples. Eucalipto. Considerado exótico em Portugal, por ter se fixado fora da sua área de distribuição natural, uma vez que ele é originário da Austrália, é proibido pelo próprio Código Civil Português, no Artigo 1366º, n.º2, que classifica a espécie como uma “árvore nociva”.


Porém, na prática, a história é um pouco diferente, segundo um relatório do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas. Em 2017, foram plantados 18.497 hectares de eucaliptos, mil hectares a mais do que no ano anterior (2016). O relatório concluiu que 86% dos hectares de arborização e rearborização feitos no país envolveram esta espécie. Nenhum outro país possui uma área relativa tão grande ocupada por eucaliptos como Portugal.


Mas se a árvore não é natural de Portugal, como ela foi lá parar? Com a chegada da época dos Descobrimentos, a necessidade do abate de árvores para a construção das naus e caravelas levou a uma devastação muito acentuada das florestas nativas portuguesas.


Até meados dos anos 30, apenas 10% do território nacional era constituído por florestas. E a segunda grande mancha florestal veio na década de 80 do século passado, quando uma grande quantidade de vegetação nativa foi derrubada para fornecer madeira para as linhas de trem que seriam construídas. 


Foi visando reflorestar estas áreas abatidas, principalmente nas regiões Norte e Centro do país, que, por iniciativa do governo, procedeu-se à plantação em massa de pinheiro bravo na década de trinta e de eucalipto na década de oitenta do século passado, em todo Portugal Continental.


Há quem diga que a culpa não é do eucalipto. Mas existe uma localidade que prova que a espécie é, sim, nociva ao terreno. Trata-se de Veiga do Lila, aldeia do conselho de Valpaços, onde, em 1989, cerca de 800 pessoas, com medo de futuros incêndios, arrancaram todos os pés das árvores de eucalipto que o governo plantaria naquela área. 


Hoje, 30 anos depois dessa grande revolta, Veiga do Lila foi uma das poucas regiões de Portugal que não mais arderam com os fogos de verão, provando que, no final de tudo, quem tinha a razão era a população que defendia seus bens e suas vidas, não o governo.


Logo A Tribuna