'Ninguém pode nos impedir de sonhar', diz Bustos sobre o desempenho do Santos na temporada

Em entrevista para A Tribuna, o treinador vê equipe em ascensão e garante postura mais ofensiva

Por: Bruno Lima  -  20/04/22  -  07:07
Atualizado em 20/04/22 - 22:29
Bustos está há pouco menos de dois meses na Vila Belmiro e aos poucos dá a sua cara ao time
Bustos está há pouco menos de dois meses na Vila Belmiro e aos poucos dá a sua cara ao time   Foto: Ivan Storti/Santos FC

Há pouco menos de dois meses Fabián Bustos foi anunciado como novo técnico do Santos. Nesse período o argentino já teve a missão de livrar o Peixe do rebaixamento no Campeonato Paulista, avançar na Copa do Brasil e iniciar as jornadas da equipe na Copa Sul-Americana e Campeonato Brasileiro. Em entrevista exclusiva para A Tribuna concedida direto de Curitiba, às vésperas do confronto com o Coritiba pela terceira fase da Copa do Brasil, às 19h30 desta quarta-feira (20), o treinador explica algumas das suas ideias de jogo, aponta Ângelo como o jovem mais promissor com que já trabalhou, defende Willian Maranhão das críticas e, entre outros temas, fala sobre as primeiras impressões do futebol brasileiro.


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Em um intervalo de três dias você vai enfrentar o Coritiba pela segunda vez. É mais fácil ou mais difícil enfrentar o mesmo adversário duas vezes seguidas?


São situações distintas. Os jogos da Copa do Brasil não são partidas de 90 minutos. São partidas de 180 minutos. Você tem que ver aquilo que convém. É olho por olho. É muito difícil que um dos dois times consiga definir o confronto já nesta quarta-feira (20). Se um dos times sair com uma pequena diferença de gols, o confronto segue aberto. Se uma das equipes constrói uma vantagem de dois ou três gols, existe o risco de relaxar na volta. Então, é um jogo de 180 minutos em que as condições são diferentes das que enfrentamos no domingo (17). Nesta partida estaremos como visitantes, em um estádio grande, contra um bom time, que perdeu apenas uma partida. Justamente para nós. Mas não é porque ganhamos no domingo que vamos ganhar agora.


Após o último jogo você comentou que, quando estiver 100%, o Ângelo será titular. Ao longo da carreira de treinador você teve contato com alguém tão jovem e habilidoso como ele?


O Ângelo tem futuro no futebol europeu. Falo isso com segurança e já falei isso para ele. Mas isso também vai depender da sua capacidade emocional, fortaleza mental e de agregar conceitos táticos. Ele segue por um bom caminho e temos que continuar apostando e o apoiando. Ele é um garoto com potencial enorme e por isso joga com naturalidade. Em toda a minha carreira não lembro de ter visto um jogador de 17 anos assim. É o jovem mais talentoso com quem já trabalhei na minha carreira.


Bustos acredita que o atacante Ângelo terá futuro no futebol europeu
Bustos acredita que o atacante Ângelo terá futuro no futebol europeu   Foto: Ivan Storti/Santos FC

As duas vitórias recentes animaram o torcedor. Você também vê o Santos em ascensão? A melhora está acontecendo conforme o planejado?


Eu não gosto quando tomamos gols e por enquanto só não sofremos gols em um jogo (contra o Fluminense). Ofensivamente, estamos crescendo. Fizemos um bom jogo no domingo. No primeiro tempo a equipe criou muitas situações, tivemos muitas variações táticas, variações de posições, jogadores bem equilibrados nas posições. E vamos por esse caminho. Os GPSs nos indicam as estatísticas e informações que vêm da fisiologia e do departamento médico, e nos mostram uma evolução no físico, nos métodos recorridos e na intensidade. Mas queremos mais. Queremos jogar melhor, sofrer menos defensivamente e dar mais alegria à nossa torcida.


A torcida do Santos é muito exigente em relação à postura ofensiva do time. Apesar de estar no início do trabalho, o torcedor pode esperar uma equipe mais agressiva sob o seu comando?


Em algum momento seremos mais ofensivos. Vamos jogar com muito mais gente no ataque e com menos atletas de marcação, porque em algumas partidas teremos que ser ousados. Não poderemos jogar sempre da mesma forma.


O atual elenco do Santos tem 33 jogadores - considerando os quatro goleiros. Na sua opinião qual é o número ideal para trabalhar numa temporada como a brasileira?


Nunca tinha trabalhado em um campeonato tão competitivo e com tantos jogos como terei aqui no Brasil, considerando as três competições (Brasileirão, Copa do Brasil e Sul-Americana). Eu, particularmente, gosto de trabalhar com 24 ou 25 de linha e quatro com goleiros. No entanto, temos um elenco grande, porque a maioria já estava aqui. Esse, porém, não é um tema que podemos resolver em um dia. Quando abrir a próxima janela de transferências temos que ver quais jogadores têm a possibilidade de sair. Temos que equilibrar as situações e ver se conseguimos trocar alguns atletas que não estão sendo utilizados por outros que venham para ajudar a equipe.


Bustos conta com 33 jogadores no elenco do Santos e não descarta liberar alguns atletas
Bustos conta com 33 jogadores no elenco do Santos e não descarta liberar alguns atletas   Foto: Ivan Storti/Santos FC

O Sandry é um jovem muito querido da torcida, mas nos últimos jogos ele pouco tem atuado. Existe alguma razão específica para essa ausência?


Quando cheguei, o Sandry vinha de um longo período parado por conta da lesão. Ele não vinha na plenitude que está agora. Nesse momento o Sandry se encontra muito bem e tem melhorado as suas condições físicas. A sua capacidade técnica é excelente e por isso a torcida o ama. É um jogador muito técnico. Quando cheguei, vimos que estava abaixo do nível dele, sem intensidade. No futebol, as estatísticas não são os únicos pontos que valem, mas são importantes. No Campeonato Paulista fomos a pior equipe em desarmes e hoje, depois de duas rodadas do Campeonato Brasileiro, somos o primeiro desse ranking. Esse é um dos motivos pelos quais não tenho usado o Sandry como titular. Os jogadores que chegaram recentemente têm a destruição como especialidade. São atletas de ordem tática e recuperação de bola. Mas posso dizer que o Sandry está ótimo e assim que tiver o equilíbrio tático e intensidade, terá mais oportunidades em campo. Estou muito contente com a evolução dele e por saber que pode disputar a posição com Willian Maranhão, Rodrigo Fernández, Vinícius Zanocelo e Camacho.


Você comentou sobre a questão dos desarmes. Essa foi a sua principal preocupação ao assumir o comando do Santos?


Sim! Se nós formos uma equipe deficiente em recuperação de bola, vamos ter um time fraco, que não conseguirá competir de igual para igual com os times mais fortes. Essa, na minha opinião, é apenas a primeira parte do processo. Depois vem a construção e vocação ofensiva, e o jogo coletivo. Tudo isso irá nos fazer propor o jogo e conseguir os gols. Eu sei que a torcida ama o Sandry e todos os Meninos da Vila. São todos tecnicamente extraordinários e estamos ajudando eles a crescerem. Eles têm muito respeito por mim, mas não posso colocá-los em campo por conta do que os outros falam. Vou colocá-los baseado naquilo que acredito e para fazer o Santos alcançar os resultados.


Na contramão do Sandry, apesar de ter chegado há pouco tempo, a torcida tem uma rejeição ao Willian Maranhão. Quais características você enxerga nele para mantê-lo no time que a torcida ainda não identificou?


Um montão de características. Precisamos muito da torcida como foi diante do Coritiba, quando nos incentivou e também aplaudiu o Maranhão em algumas jogadas. Todos nós queremos construir um Santos que seja protagonista. Cada peça que está dentro de campo tem a sua função. Na última partida começamos com o Vinícius Zanocelo, que é um grande jogador, com muita vocação ofensiva, se associa bem com os atacantes. Porém, no segundo tempo perdemos a capacidade de recuperação de bolas e recorri ao Willian Maranhão. Se olharmos as estatísticas, vamos ver quantos desarmes realiza Maranhão e quantos realiza qualquer companheiro. Isso explica por que ele é importante. Tecnicamente, Sandry, Zanocelo e outros jogadores são superiores ao Maranhão. Mas taticamente em desarmes, recuperação de bola e intensidade os números dele são superiores. O Maranhão veste a camisa do Santos e todos que vestem essa camisa gloriosa têm que ser apoiados. Explicações para colocá-lo em campo tenho diversas, mas provavelmente alguns não concordarão. Em todo caso, peço aos torcedores que apoiem o Santos e não determinados jogadores. Um time não se forma somente por aqueles que entram em campo. Temos que ter equilíbrio.


Bustos defende o volante Willian Maranhão e pede o apoio da torcida com o jogador
Bustos defende o volante Willian Maranhão e pede o apoio da torcida com o jogador   Foto: Ivan Storti/Santos FC

A lateral direita é um antigo problema no elenco do Santos e o Auro foi contratado nesse ano com status de titular, mas não tem atuado regularmente. Por quê?


Quando ele ficou fora de algumas partidas foi porque decidimos contar com um jogador ofensivo a mais entre os relacionados, para, caso fosse necessário, mudar um resultado adverso. Mas não é correto dizer que ele é um jogador que não figura no elenco. O Auro é um atleta de primeira divisão, com passagens por seleções de base do Brasil e com passagens pelo futebol do exterior. Foi um jogador contratado para competir com Madson, por exemplo, pela titularidade na lateral direita. A minha opinião sobre ele é que se trata de um bom jogador, com boas características, mas que assim como Sandry vem de um longo período de inatividade. Existem jogadores que colocam a camisa e jogam. Porém, existem jogadores que custam mais para se adaptar. Além disso, quando ele tentou jogar nós não estávamos fortes como time. E isso custou muito a todos. É preciso lembrar também que não tenho apenas 22 jogadores. São 29 atletas de linha e isso resulta numa ótima disputa. Cabe a mim ver quais são aqueles que estão melhores no dia a dia para colocar em campo e levar aos jogos.


Por conta das dificuldades financeiras, o torcedor do Santos até entende o fato de a equipe não disputar os principais títulos. Porém, não aguenta mais brigar contra o rebaixamento. Com o time que tem nas mãos hoje, você consegue afirmar que a equipe terá um Brasileirão mais tranquilo do que o de 2021?


Ninguém pode nos impedir de sonhar. Não tenho como assegurar que vamos fazer um campeonato tranquilo, porque o Brasileirão é uma competição muito parelha. E acredito que nesse ano será ainda mais parelho do que nas outras temporadas. No meio disso temos muitas viagens, jogos da Copa do Brasil. Para esse jogo contra o Coritiba, por exemplo, levamos sete horas para chegar aqui. Vamos jogar nesta quarta-feira (20) e, na sequência, no domingo (24), temos jogo contra o América-MG (na Vila Belmiro, às 16 horas) pelo Brasileirão. Em seguida, viajamos para o Chile para a partida da Copa Sul-Americana contra o Unión La Calera. Não estou reclamando, gosto disso e já sabia como era o futebol brasileiro. Com muita intensidade e complicações. Mas não posso assegurar que não vamos sofrer. O ideal seria que tivéssemos uma equipe competindo para pegar as copas internacionais por meio do Brasileirão, jogar o máximo possível na Copa do Brasil e chegar o mais distante na Copa Sul-Americana. Com o tempo de trabalho, acredito que a equipe vai melhorar e vamos tentar competir com equipes como o Palmeiras, que está há mais de um ano com o mesmo treinador, e o Atlético-MG, que, por mais que tenha mudado de treinador, manteve a excelente base. E não só esses dois. O Corinthians está muito bem, o Fluminense e Flamengo também. O Athletico-PR não começou bem no Brasileirão, mas tem uma estrutura muito boa, o Ceará está muito bem. Então vejo o campeonato muito nivelado e muito complicado. Acredito que nós estamos melhores hoje do que estávamos há um mês, e tomara que piores do que daqui a três meses.


O Abel Ferreira, treinador do Palmeiras, regularmente critica o calendário brasileiro. Isso é algo que também te preocupa?


Acredito que o Abel seja um dos três melhores técnicos do continente e isso tem sido demonstrado com os seus resultados importantíssimos. Ele teve dois anos sofrendo o que estou começando a sofrer. É verdade o que ele fala sobre o calendário. Teria que ter alguma semana para que os jogadores pudessem recuperar melhor a intensidade e parte física. E, consequentemente, para que os treinadores pudessem trabalhar mais parte tática do grupo e fazer as equipes crescerem. Mas isso também ocorre na Europa. Na Espanha tem o Campeonato Espanhol, a Copa do Rei, Copa da Espanha, Liga dos Campeões. É quase a mesma coisa. Nós temos que nos acostumar, é assim. Mas entendo o Abel. Quando cheguei não tive tempo para trabalhar. Era possível apenas recuperar os jogadores, trabalhar a parte tática e jogar. Essa situação não tem muita solução. Nesse ano ainda temos a Copa do Mundo, tivemos as Eliminatórias e competições internacionais. Apesar disso, prefiro o calendário assim, porque só teremos semanas largas se formos eliminados de alguma competição.


Bustos coloca Abel Ferreira, técnico do Palmeiras, entre os três melhores técnico do continente
Bustos coloca Abel Ferreira, técnico do Palmeiras, entre os três melhores técnico do continente   Foto: Cesar Greco/Palmeiras

Como tem sido a sua relação com a torcida do Santos?


Tem sido muito boa. Obviamente que, quando o resultado não agrada, tem gente que critica, que fala e é normal. Isso é futebol. Tenho que estar acostumado e ir trabalhando para conquistar os resultados, e, aos poucos, mudando a visão daqueles que têm opiniões negativas. Mas a minha relação com eles têm sido de muito carinho e apoio. Seja nas redes sociais ou no dia a dia. Às vezes vou com a minha mulher ao mercado e eles pedem para tirar fotos. Tenho me sentido muito bem aqui.


E a adaptação à cidade de Santos? Tem ido à praia? Já conseguiu sair para conhecer alguns lugares?


Na praia fui somente um dia, porque tenho duas filhas pequenas (Fabiana e Luciana, de 6 e 4 anos, respectivamente) que gostam muito da praia. Mas só pude ir um dia, porque foi a única vez que tive o tempo livre. Além disso, passeei por algumas horas em Guarujá, Praia Grande e São Vicente. Achei tudo muito bonito e perto. Estamos bem acomodados. E tenho gostado muito dos brasileiros. Vocês não enxergam problema em nada. Não ficam olhando como os outros estão vestidos. Não se preocupam. Acho essa cultura dos brasileiros muito legal.


Para terminar, a pergunta que precisa ser feita a um treinador argentino que comanda o Santos. Quem foi melhor: Pelé ou Maradona?


Assim você quer me matar (risos). Recentemente, o Lucas Pires e Ângelo me perguntaram quem é melhor: Messi ou Cristiano Ronaldo? Falei para eles desfrutarem dos dois. Eu desfrutei do Maradona, porque pude assisti-lo. Já o Pelé, vi apenas por imagens antigas de televisão. São dois extraordinários, tops. Não se pode compará-los. Penso que essa pergunta é muito mais para os torcedores do que para os treinadores que vivem de futebol. As pessoas que vivem de futebol e trabalham com futebol gostam de desfrutar dos gênios. Pelé é gênio, Maradona é gênio, Messi é gênio, Cristiano Ronaldo é gênio, Ronaldinho é gênio, Zidane, Benzema, Mbappé, Neymar, todos craques, tops.


Fabián Bustos evitou polêmica e não quis opinar sobre quem melhor entre Pelé e Maradona
Fabián Bustos evitou polêmica e não quis opinar sobre quem melhor entre Pelé e Maradona   Foto: Ivan Storti/Santos FC

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