Santista desbrava o mundo montada em uma bike e conta sobre aventuras: 'Espírito livre'
Lorene Rodrigues, 39 anos, acredita já ter pedalado mais de 7 mil km pelo continente europeu
Atualizado em 10/02/22 - 17:13
Das pedaladas à escola aos trajetos para o trabalho, a engenheira santista Lorene da Mota Rodrigues, de 39 anos, desenvolveu uma paixão pelas cicloviagens. Hoje em Portugal, ela afirma já ter rodado 7 mil quilômetros sobre duas rodas pela Europa. E, no que depender dela, as pernas ainda terão muito trabalho pela frente. A ciclista planeja cruzar o estreito de Gibraltar, seguir sentido ao Continente Africano e finalizar o roteiro em Israel, no Oriente Médio - uma viagem de um ano.
Lorene conta que no começo usava o meio de transporte para ir à escola. Depois, passou a ir cada vez mais longe: de Santos a Praia Grande, a São Paulo e até para fora do Estado. A princípio, ela encarava as pedaladas com amigos, mas, a partir de uma viagem à Bahia, o caminho se tornou solitário.
Ela lembra que, em determinado momento, precisou omitir à família sobre as longas pedaladas sozinha. "Eles achavam muito perigoso, mas, quando estava no caminho (para a Bahia), viram que era relativamente seguro", diz ela, que, morando na Europa desde 2018, agora pedala entre países, como: Alemanha, França, Bélgica e Holanda.
"No caminho sempre sou motivo de muita curiosidade, por ser mulher, negra, cicloviajante e estar sozinha. As pessoas me param pra saber se estou bem, se não tenho medo, se preciso de algo, se estou fazendo promessa, mas é apenas meu espírito que é livre. Gosto de conhecer novas culturas", ressalta a engenheira.
Para as longas pedaladas, ela leva um estoque de comida que diz ser suficiente para ao menos dois dias. Lorene explica ainda que, após 16 horas de pedalada, costuma procurar lugar para acampar e descansar. Só pela manhã ela volta à atividade ao definir e traçar a rota do dia.
Não estava planejado
Mas atenção, a cicloviajante alerta que nem tudo sai como o planejado. Ela conta que já aconteceu de animais devorarem sua reserva de comida. "Estava me preparando para acampar quando cachorros do mato, creio eu, começaram a rosnar pra mim de longe. Eles não se aproximaram e eu entendi o recado. Era uma questão de território, fui convidada a me retirar", completa Lorene.
Pedaladas pela Europa
Em 2018, Lorene decidiu aceitar um convite da coordenadora de mestrado da Universidade Nova de Lisboa, Maria Paulina, e cruzou o Oceano Atlântico para estudar em Portugal. Lá, concluiu o mestrado em Reabilitação de Edifícios.
Não demorou muito e ela recebeu autorização para trabalhar como engenheira no país. Atualmente, fiscaliza obras públicas.
"É curiosa a minha relação com os engenheiros portugueses, pois sou mulher, negra, brasileira e ciclista. Isso sempre gera imensas discussões. Sempre tenho de explicar o uso da bicicleta como meio de transporte. É raro ver mulheres negras engenheiras, tampouco ciclistas", conta Lorene.
Diante das dificuldades de se fazer entender perante aos profissionais mais antigos, ela tenta educar os novatos sobre tais questões. "Sempre que chega um engenheiro novo eu digo que tenho que educar para que amplie os horizontes e encare a bicicleta como meio de transporte".
Brasil e Europa
Lorene ressalta que, dependendo da região, seja na Europa ou no Brasil, a bicicleta é encarada como meio de transporte ou exclusivamente para lazer. Ela cita que na Baixada Santista existe uma boa infraestrutura para os ciclistas, que pode ser comparada a de países europeus, como Bélgica, Holanda e Alemanha.
Em São Paulo, no entanto, os trajetos de bike, de acordo com ela, são mais difíceis, pois esbarram no desrespeito de motoristas a ciclistas.
"Portugal ainda está engatinhando (na infraestrutura). Vejo melhorias, mas o número de ciclistas ainda está crescendo. Eles ainda não veem a bicicleta como meio de transporte e sim como lazer. Por conta disso, é difícil criar políticas públicas relacionas à mobilidade urbana, algoque priorize o uso da bicicleta", destaca.
Apesar disso, Lorene observa que o interesse dos portuguesas nas bicicletas cresceu durante a pandemia. "Vi a situação melhorar e muito. O número de ciclovias aumentou consideravelmente. Isso nos ajuda muito pois cria novos adeptos".
Viagem emocionante
Ela relembrou para A Tribunauma das melhores viagens que fez ao pedalar de Paris, na França, até Amsterdã, na Holanda, onde a irmã mora. A família até registrou a chegada de Lorene. (confira o vídeo)
Com tantas viagens, Lorene ressalta que suas rotas são sempre gratificantes. Ela conta que gostaria de estimular mais pessoas a usarem bicicletas, pois entende que estas podem ter as mesmas oportunidades de conhecer e explorar novos lugares e culturas.
"Aprendi uma coisa: a gente atrai pessoas exatamente como nós. Eu sempre atraio pessoas com a mesma vibe que a minha. Posso estar quieta num canto que eles chegam. O melhor dos lugares são pessoas. Às vezes, o lugar em si não me diz muito, mas as pessoas fazem toda a diferença".