Músico de rua leva ovada no Gonzaga em Santos: 'Violoncelo está fedendo'

Instrumento atingido é 'xodó' de jovem e foi presente de bisavô; desempregado, artista dorme em carro

Por: Bruno Almeida  -  06/10/21  -  07:28
 Músico levou ovada enquanto tocava no Gonzaga, em Santos; restos de ovo foram parar no chão
Músico levou ovada enquanto tocava no Gonzaga, em Santos; restos de ovo foram parar no chão   Foto: Reprodução/Redes sociais

O músico de rua Luiz Felipe Salinas Almeida tocava violoncelo em frente a uma loja de música no Gonzaga, em Santos, quando passou por um episódio constrangedor na tarde desta terça-feira (5). Um ovo foi atirado do alto de um prédio, localizado na Avenida Floriano Peixoto, atingindo o instrumento musical do artista.


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"O violoncelo está cheirando a ovo agora, está fedendo", conta. O instrumento custa em torno de R$ 1.000,00. O valor, no entanto, nem seria o maior problema. O violoncelo foi presente do bisavô do jovem. "Ele é meu xodó. Tenho desde meus 13 anos".


Com o impacto, ele achou que o instrumento havia quebrado sozinho, já que ouviu um estalo forte. Equipamentos de som conectados ao violoncelo também foram atingidos pelo ovo. Ao ver microfone e instrumento sujos, passou a procurar de onde o ovo havia sido atirado, mas não encontrou. "Eu olhava para cima, mirando o prédio, sem acreditar. Era um sentimento de constrangimento, de vergonha. O pessoal em volta ficou revoltado também".


 Momentos antes da ovada, músico arrumava equipamentos
Momentos antes da ovada, músico arrumava equipamentos   Foto: Arquivo pessoal

Sem amor ao próximo
Nascido em Sorocaba, Almeida, hoje com 20 anos, veio morar em Santos há duas semanas, em busca de oportunidades de trabalho. Com um filho pequeno e dormindo no próprio carro para conter despesas, ele já havia tocado em ruas de outras cidades de São Paulo, mas jamais foi alvo de um ataque como esse.


"Há pessoas que não têm amor ao próximo. Espero muito que isso não se repita. Com a grana que eu tiro, pago minhas contas, mantenho em dia a pensão do meu filho e as parcelas do meu carro".


Músico independente, Almeida toca desde os 7 anos e já teve aulas com professores do Conservatório de Tatuí, considerada a maior escola de música e artes cênicas da América Latina. Também já trabalhou em aniversários, casamentos, jantares e bares.


O episódio ocorreu próximo a um dos locais mais movimentados da Cidade. Por isso, Salinas acredita que a ovada não foi motivada pelo barulho. "Se o problema fosse volume, poderiam ter trocado uma ideia comigo, mas nem vieram", desabafa.


Apoio
Embaixo do edifício de onde o ovo foi jogado funciona a loja de instrumentos musicais Musical Store. Almeida relata que funcionários do estabelecimento o ajudaram quando viram o que aconteceu. "Eles me arrumaram um pano para eu limpar tudo e elogiaram meu som. Pessoas que passavam na rua também me deram apoio".


O gerente da loja, Eduardo Salgado Júnior, contou que ele e os funcionários sempre procuram valorizar os artistas de rua, pois trabalham com música.


"Esse rapaz estava tocando praticamente em frente à vitrine da nossa loja. Ao escutar o som, fui lá conversar com ele, elogiamos a qualidade do trabalho e ajudamos tecnicamente, com a regulagem do som. Não estava muito alto. Inclusive combinamos dele retornar ali no fim de semana, pois seria legal unirmos forças. O rapaz estava tocando, mostrando sua arte, e tomou uma ovada por causa disso? É inexplicável, triste e revoltante".


Após o ocorrido, o músico ficou embaixo de um toldo, para se proteger de novas ovadas, e seguiu tocando. Salgado Júnior destaca que, apesar do constrangimento, o artista não pensou em sair do local. "Ele disse que não iria se abater e continuaria a tocar".


Contudo, Almeida conta que ainda não sabe se vai permanecer na Cidade por um longo período. "Preciso pagar minhas contas, então pretendo ficar pelo menos até a temporada".






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