Estudo analisa ‘explosão’ de tilápias nos canais de Santos

Esses peixes proliferam nos canais de Santos, onde há pesca indevida e se põe em risco a saúde de quem consome esses animais

Por: Matheus Müller & Da Redação &  -  14/12/20  -  20:04
“Se a água (dos canais) estivesse totalmente ruim, não teria tilápia lá”, diz o biólogo Bruno Paes
“Se a água (dos canais) estivesse totalmente ruim, não teria tilápia lá”, diz o biólogo Bruno Paes   Foto: Arquivo/Alexsander Ferraz

“Os canais de Santos estão vivos. São ecossistemas artificiais”. A afirmação, em tom de alerta, do biólogo e professor Bruno Paes De Carli é para todos os que se surpreendem com o aparente aumento populacional de tilápias no sistema de saneamento projetado por Saturnino de Brito.


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A estranheza de muitos ao observarem esses peixes em um local considerado poluído está sob análise do professor, em um projeto que completará dois anos. “Se a água estivesse totalmente ruim, não teria tilápia lá”, declarou. 


Ao mesmo tempo em que o professor e pesquisador desenvolve o trabalho, que avalia a saúde dos animais e a qualidade das águas, a Prefeitura de Santos explica que tilápias foram descartadas clandestinamente nos canais, o que, de acordo com o biólogo e coordenador do Aquário de Santos, Alex Ribeiro, tende a desequilibrar o ecossistema da região. 


“Qualquer espécie invasora, que não seja do ambiente, vai provocar um desequilíbrio, seja na cadeia alimentar, na produção de dejetos, na competição por alimentos com outras espécies. Temos contato direto com pescadores, até para saber como está a fauna, e eles relatam que, passando a rede próximo aos canais, já pescaram tilápias. Logo, esses animais já estão se adaptando a viver próximo daquela salinidade. O problema é bem delicado”, diz Ribeiro. 


O coordenador do Aquário conta que já observa essas tilápias há um bom tempo nos canais e destaca a capacidade de adaptação da espécie, que é de água doce, mas “vive muito bem em águas estuarinas, com uma salinidade um pouco maior”. E complementa: “É um animal onívoro, que se alimenta com qualquer alimento que caiba na boca, como frutos, outros peixes. Já se encontrou até lixo”. 


Pesca e alimentação


Uma cena que tem se mostrado comum é a pesca desses peixes nos canais. Porém, a prática é proibida por lei, com multa de R$ 500,00 em caso de reincidência. A situação fez a vereador Telma de Souza (PT) apresentar um requerimento, no dia 3, cobrando respostas da Prefeitura quanto a estudos e análises dos impactos gerados pelos peixes na região e questionando sobre riscos do consumo desses animais.


De antemão, os biólogos ouvidos por A Tribuna orientam que ninguém se alimente desses peixes. Ribeiro ressalta: “Isso é muito ruim. Além de ser proibido (pescar), não deve ser feito (o consumo). Os animais estão em uma água sem tratamento, exposta, uma água sem controle de qualidade.” 


A Seção de Vigilância Sanitária reforça o alerta e “não recomenda o consumo de peixes pescados nos canais”, que “recebem água residual não tratada, oriunda de galerias pluviais, enchentes, mar (após abertura de comportas) e, eventualmente, descartes clandestinos”.


Proibida


A pesca nos canais de Santos está proibida pela Lei Complementar 932, de 2016, de autoria do então vereador Marcus de Rosis (morto em 2015) e sancionada pelo prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB). A infração resulta em advertência e, na reincidência, em multa de R$ 500,00 e apreensão dos equipamentos de pesca. 


Para biólogo, peixes indicam salubridade dos canais


Há quase dois anos, o biólogo Bruno Paes De Carli analisa as tilápias dos canais de Santos. Ele conta que o projeto surgiu para avaliar a fauna existente nesses locais e mudar a percepção de parte da população sobre o espaço, considerado por muitos um ambiente sujo. 


De Carli ressalta que “os canais estão vivos” e as tilápias são prova disso, pois, se a água fosse tão ruim, elas não teriam se ambientado aos canais. Desde janeiro do ano passado, ele captura peixes com armadilhas e vara. Já pegou 11, dos quais analisa tamanho, peso e sangue. Os exemplares recolhidos dos canais são anestesiados e devolvidos ao ambiente. 


Os estudos, que têm participação do coordenador do Aquário de Santos, estão em andamento.


O profissional acredita que, com mais 11 amostras, será possível concluir parte da pesquisa. A ideia dele é cultivar alguns desses peixes em ambiente controlado para compará-los aos exemplares tirados dos canais e monitorar a qualidade da água desse sistema de drenagem.


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