Caravela estilizada, a história do monumento de concreto instalado nos jardins da praia de Santos

Obra foi entregue à população pelo então primeiro-ministro de Portugal, Cavaco Silva, em 1988

Por: Sergio Willians  -  29/05/22  -  19:14
Atualizado em 29/05/22 - 23:11
Monumento oferecia uma linguagem estética única, com seus 6 metros de altura e inclinação de 10 graus
Monumento oferecia uma linguagem estética única, com seus 6 metros de altura e inclinação de 10 graus   Foto: Reprodução

Santos, julho de 1987. Tudo começou com um concurso promovido pelo Conselho da Comunidade da Área de Jurisdição do Consulado de Portugal em Santos, que premiaria com uma viagem a Lisboa quem desenvolvesse um projeto para a revitalização da praça existente na confluência da Avenida Washington Luís com a Rua Barão de Paranapiacaba.

A ideia era transformar aquele espaço num pedacinho de Portugal. Dez trabalhos foram apresentados e o vencedor foi o assinado pela arquiteta Regina Maria Lourenço Adegas, que bolou, em parceria com o designer Ricardo Campos Mota, o Rica, uma caravela de concreto, de 6 metros de altura.


Ocorre que a proposta do local acabou sendo alterada alguns meses depois. O então prefeito Oswaldo Justo, em razão das proximidades dos 500 anos do descobrimento português e bastante empolgado com a obra, ofereceu um espaço na região da orla praiana, nas proximidades do Aquário Municipal. A ideia era correr para inaugurar o monumento nas festividades do dia 10 de junho (Dia de Portugal).


A Prefeitura conseguiu buscar a adesão da empresa Ventura Empreendimentos Imobiliários, que se ofereceu para fornecer mão de obra e material para viabilizar o projeto. Além do aspecto histórico, o monumento tinha potencial para se tornar mais um atrativo turístico.


Ricardo Campos Mota acompanhou diretamente cada etapa do trabalho de construção da caravela, no galpão da empresa Retroporto, do Grupo Dickinson. A forma foi montada sem muitas dificuldades. Um aspecto que empolgava o autor da obra era o piso feito em cerâmica vermelha, de cerca de 30 metros, que contornaria a peça principal. Rica, com a colaboração arquiteto Antonio Roberto Simões Ventríglia, sugeriu que tal piso, elaborado para dar a ideia do rastro da caravela no mar, atuasse como um complemento da escultura, figurando não somente como uma simples base, mas um pedaço importante da obra de arte. “Será como uma ilustração no chão”, disse Rica na época.


A caravela foi construída em concreto aparente, com linhas muito suaves e ostentava velas estilizadas. Com 6 metros de altura, a peça foi levemente inclinada (em 10 graus em relação ao piso).


No dia 25 de abril de 1988, uma segunda-feira, finalmente a peça foi enviada para seu lugar definitivo. Foi necessário o uso de um caminhão especial da então Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), estatal que administrou o Porto de Santos, e um guindaste bantan com capacidade de levantar 14 toneladas (a peça tinha 3 toneladas). A operação de içamento para os jardins da praia começou cerca de 11 horas. Dez minutos depois, um susto: uma das cintas de amarração arrebentou, provocando a queda da enorme escultura sobre o gramado. O acidente fez com que a peça de concreto passasse por sua primeira prova de resistência. E passou, sem feridos.


A obra Caravela foi solenemente inaugurada em um sábado, dia 11 de junho de 1988, embaixo de uma insistente chuva, pelo então primeiro-ministro de Portugal, Aníbal Cavaco Silva (1985-1995), diante de mais de duas mil pessoas que compareceram às imediações do Aquário para celebrar a grande obra de exaltação ao povo lusitano. A Caravela foi o único monumento da cidade inaugurado por um chefe de Estado estrangeiro na história de Santos.


Prêmio para o artista e a atual situação


Ricardo Mota e Regina Adegas receberam como prêmio pelo concurso uma passagem de ida e volta a Lisboa. Rica aproveitou sua ida à Europa para fazer cursos e trabalhos na área do design e artes. De Portugal, mudou-se para Torino (Itália), onde morou por seis anos.


Praticamente 20 anos depois, a Caravela, já integrada à paisagem da Ponta da Praia, perdeu um importante pedaço da obra, além da placa de bronze, que foi furtada. Em uma das obras de manutenção dos jardins envoltórios do Aquário, a Secretaria Municipal de Obras acabou retirando boa parte dos azulejos que compunham o “rastro” da caravela, descaracterizando a estética do monumento. É como se a caravela deixasse de navegar. A Prefeitura está avaliando a recolocação dos azulejos, de tal modo que a obra retome o brilho original que marcou sua origem, há 35 anos. Rica deve acompanhar o processo de restauração daquele local, resgatando este importante patrimônio artístico santista.


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