Mulher trans afirma ter sido perseguida e constrangida em academia no litoral de SP: 'Humilhante'

Paola Bandeira, de 26 anos, afirma sentir 'vontade de ir embora' da região após o ocorrido

Por: Raphaella Santucci  -  19/03/22  -  09:46
Mulher transexual denuncia ato preconceituoso de academia em Peruíbe, no litoral de SP
Mulher transexual denuncia ato preconceituoso de academia em Peruíbe, no litoral de SP   Foto: Arquivo pessoal

Uma mulher transexual alega ter sofrido situações de preconceito em uma academia que costumava frequentar no bairro Jardim dos Prados, em Peruíbe, litoral de São Paulo. Em entrevista para A Tribuna, Paola Bandeira, de 26 anos, natural de Ipiaú, município da Bahia, afirma que foi 'perseguida' pelo atual dono do estabelecimento, que chegou a proibi-la de treinar e censurou ações da mesma.


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A vítima relata que desde o ano passado, quando ingressou na academia, o dono do local impôs restrições para ela, caso quisesse mesmo se exercitar por lá. "Ele quis mudar meu vocabulário, minhas vestes e meu comportamento", relembrou. Ela diz que aceitou as condições, pois é o único local para treinar em seu bairro.


Em uma determinada situação, ocorrida no ano passado, o proprietário do local chegou a barrar a entrada de Paola, segundo ela, dizendo que a mensalidade estava atrasada e que por isso não poderia adentrar o estabelecimento. "Quando provei que havia pagado, ele tirou o dinheiro do bolso e me devolveu para que eu me retirasse de lá. Saí com o coração apertado, constrangida".


Após o ocorrido, a mulher relata que 2021 foi um dos piores anos de sua vida por conta das situações enfrentadas na academia. "Eu não comia nem dormia. Minha mente estava um turbilhão". Ela ficou afastada da academia durante um ano, e por incentivo de suas amigas, fez sua matrícula novamente no local em 2022. Segundo Paola, elas disseram que o proprietário não estava frequentando o período da manhã, que ela costumava ir.


'Nunca passei por isso na vida'


Com o retorno ao estabelecimento, a jovem conta que ficou até feliz no início, devido ao apoio das amigas e por ter voltado a se exercitar. Porém, uma semana depois, o dono chegou acompanhado da advogada do estabelecimento chamando Paola em uma sala restrita para reunião. Segundo a vítima, nesta sala estavam pessoas que ela não se sentia segura e confortável.


Na conversa, a mulher foi interrogada sobre coisas íntimas. A advogada questionou o vocabulário de Paola, que costumava chamar suas amigas próximas de 'gostosas' e usar a palavra 'racha', expressão original da Bahia.


"Expliquei que é meu jeito carinhoso de chamar as pessoas que estão comigo. Só chamo assim minhas amigas íntimas, mas eles se incomodaram", disse. No desenrolar da conversa, a advogada perguntou, de repente, se Paola já havia feito a cirurgia para troca de sexo.


Mesmo chocada com a pergunta, a aluna explicou que ainda não teve a oportunidade devido aos altos custos da cirurgia, mas que tem o sonho de realizar a troca. Paola mudou de nome em 2021, no cartório da sua cidade natal. "O advogado falou que seria difícil fazer isso em Peruíbe. Tive força de vontade e fui até a Bahia mudar meu nome", contou.


Ao saber que a mulher ainda não realizou a cirurgia de redesignação sexual, a advogada comunicou que Paola não poderia mais usar o banheiro feminino da academia. "Fiquei frustrada. Se eu usasse o banheiro masculino seria humilhante para mim, não posso ser obrigada a isso. Abordei a questão da placa unissex. Já que não posso usar o banheiro que me sinto confortável, quero um para que todos possam frequentar", apontou na reunião.


Paola conta, ainda, que nunca passou por isso na vida. Segundo ela, é difícil ser acusada de ser de um gênero que não é. "Dessa vez eu não me deixei levar pela depressão. Todos estão do meu lado, minhas amigas deixaram de ir na academia por repudiarem a atitude deles", contou. Após a situação, Paola fez o boletim de ocorrência em uma delegacia da cidade.


Em nota, o advogado de defesa de Paola, Renan Gutevein Fernandes Pereira, diz que o ocorrido pode inspirar outras mulheres a não aceitar situações como essa; leia a nota na íntegra:


"O fato de Paola estar divulgando o caso a nível regional, avalio a situação como totalmente inspiradora, corajosa e louvável, pois outras mulheres trans, ao saberem de situação, podem se sentir ensinadas com o ocorrido. Ou seja, de uma situação totalmente triste, podemos extrair algo positivo, no sentido de educarmos outras mulheres trans e a população dos direitos assegurados às pessoas transsexuais.


Mulheres trans são mulheres e devem utilizar o banheiro feminino em toda e qualquer hipótese, tal assunto sequer deveria ser algo a ser questionado, pois como eu mencionei e repito: mulheres trans são mulheres".


A Reportagem de A Tribuna procurou a defesa da academia, mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.


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