Pandemia gera aumento na demanda de atendimento especializado em saúde mental na Baixada Santista

Em algumas cidades da região, procura por serviços psicológico e psiquiátrico cresceu 60% de 2020 para 2021

Por: Régis Querino  -  02/03/22  -  20:23
Em Santos, as policlínicas oferecem acolhimento e consulta a pessoas que sofrem transtornos mentais e comportamentais leves
Em Santos, as policlínicas oferecem acolhimento e consulta a pessoas que sofrem transtornos mentais e comportamentais leves   Foto: Alberto Marques/Arquivo/AT

A pandemia de Covid-19 desencadeou uma série de mudanças no cotidiano das pessoas e os reflexos podem ser vistos nas Unidades de Pronto Atendimento (Upas) e serviços públicos especializados no tratamento de transtornos mentais e comportamentais nas cidades da Baixada Santista. Em levantamento feito nas nove cidades da região feito por A Tribuna, os números não mentem: a sociedade adoeceu em função dos efeitos causados pelo coronavírus e em alguns municípios ou unidades de atendimento a procura por psicólogos e psiquiatras cresceu 60% em 2021, em relação à demanda de 2020.


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Muitos foram os fatores citados pelo pessoal da Saúde para o aumento do número de pacientes na rede pública, já que o isolamento social agravou as condições de vulnerabilidade social, financeira e emocional. Diante desse cenário, os casos de ansiedade, crise fóbica, bipolaridade, compulsão, depressão, pensamento suicida, autoagressão, esquizofrenia, violência doméstica, abuso sexual infantil e luto levaram muita gente aos consultórios.


“A pandemia contribuiu bastante pra o adoecimento das pessoas. As mudanças nos cenários social e financeiro fizeram com que muita gente perdesse o emprego e o plano de saúde, passando a procurar o serviço público. Tudo colaborou para as pessoas ficarem com medo e pensarem se elas teriam condições de levar projetos adiante ou garantir o seu sustento ou o futuro dos filhos”, diz a psicóloga Letícia Katarine Ferreira dos Santos, coordenadora de Saúde Mental da Prefeitura de Santos.


Na Cidade, o atendimento em saúde mental é feito por uma equipe multidisciplinar. Nas policlínicas, que atendem os casos considerados mais leves, com o acolhimento pela equipe de enfermagem e consulta com o clínico. Os casos mais severos contam com o suporte dos Centros de Atendimento Psicossocial (Caps), que dispõem de terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, enfermeiros, psicólogos e psiquiatras.


De acordo com a Secretaria de Saúde de Santos, em 2021 foram registrados 25.206 atendimentos nas policlínicas, diante dos 7.752 apontados em 2020. Apesar do crescimento expressivo, o órgão salienta que uma mesma pessoa pode ter passado por mais de um atendimento. Nos Caps, os dados se referem a pessoas únicas que se tornaram pacientes para tratar de casos mais severos, como depressão, ideação suicida e esquizofrenia, por exemplo. Neste caso, a demanda diminuiu de 2.400 pessoas em 2020 para 1.900 em 2021.


“É preciso fazer uma análise desses números, porque nos períodos maiores de restrição, em razão da pandemia, houve queda na procura de alguns serviços. Temos uma média de 2.500 a 3.000 casos ativos, com acompanhamento regular nos últimos 12 meses em cada CAP adulto (são cinco unidades em Santos). No CAP infanto-juvenil é menor, de 600 a 800 casos. É um processo de adoecimento coletivo”, ressalta Letícia Katarine.


Em Santos, a equipe multiprofissional conta com 23 acompanhantes terapêuticos, 20 assistentes sociais, 39 auxiliares de enfermagem, 25 enfermeiros, 8 farmacêuticos, 2 fonoaudiólogos, 29 médicos, 30 psicólogos, 87 técnicos de enfermagem e 10 terapeutas ocupacionais. O concurso público, que teve inscrições encerradas na última quinta-feira (24), prevê vagas para médicos, acompanhantes terapêuticos e terapeutas ocupacionais.


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Outras cidades

Em Guarujá, a Secretaria Municipal de Saúde tem como porta de entrada para atendimento psicológico do SUS as 15 Unidades de Saúde da Família (Usafas) e as seis Unidades Básicas de Saúde (UBSs). Nessas unidades, o aumento de atendimentos foi de quase 20% se comparado aos números de 2020 (15.310) e 2021 (18.217). Já nos Caps, a Coordenação de Saúde Mental da Prefeitura salienta que o aumento de um ano para o outro foi de aproximadamente 50% na procura, em função da pandemia.


As Unidades de Saúde da Família são a porta de entrada para os serviços especializados em Guarujá
As Unidades de Saúde da Família são a porta de entrada para os serviços especializados em Guarujá   Foto: Rogério Soares/AT

De acordo com a secretaria, o CAP III, no Jardim Boa Esperança, registrou um aumento de 50% de novos casos, com destaque para situações de luto e perdas financeiras em 2020. No ano passado prevaleceram os transtornos de ansiedade e pensamentos suicidas. A procura maior aos serviços na unidade foi de mulheres na faixa etária de 18 a 30 anos.


“Pensando em estratégias viáveis e com retorno efetivo a médio e longo prazo, a Coordenação de Saúde Mental e a Secretaria de Educação estão realizando reuniões de planejamento e implantação de uma nova política pública, com foco na prevenção ao sofrimento emocional e psíquico com crianças e adolescentes nas escolas. O projeto será realizado por psicólogos e assistentes sociais dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família e a equipe multiprofissional de apoio psicopedagógico da Seduc. Acreditamos que quando trabalhamos a prevenção, as incidências dos agravos diminuem”, avalia Luana Gargiulo, coordenadora de Saúde Mental da Prefeitura de Guarujá.


Em Praia Grande, o aumento foi de 16% no volume de atendimentos e passou de 8.475 em 2020 para 9.828 no ano passado. São 30 profissionais, entre psicólogos e psiquiatras, que atuam na rede, com atendimento psicossocial dividido em quatro equipamentos: dois Centros de Atenção Psicossocial (Caps II) nos Bairros Boqueirão e Vila Mirim, um Caps Álcool e Drogas (Caps AD) e outro Infantil (Caps i). Para ter acesso aos serviços, o usuário precisa passar por uma Unidade de Saúde da Família e ser encaminhado pelo médico.


Em São Vicente, a Secretaria de Saúde (Sesau) registrou uma média de 16 novos atendimentos por mês em cada uma das unidades de Saúde Mental da Cidade, entre os anos de 2020 e 2021. No Caps Álcool e Drogas foram realizados 1.707 atendimentos em 2020 e 810 no ano passado. “Muitos pacientes abandonaram o tratamento no ano passado e o serviço faz busca ativa para que eles retornem e deem continuidade à terapia”, informou a secretaria, em nota.


Segundo a Prefeitura, são 11 psicólogos e oito psiquiatras trabalhando na saúde mental do município e apesar do chamamento de 13 médicos especialistas, habilitados através do Concurso Público n° 001/2020, apenas um aceitou a vaga. A Sesau diz estudar alternativas para a contratação de mais profissionais, mas “esbarra na burocracia de processos administrativos e na Lei de Responsabilidade Fiscal, que restringe o teto para gastos com o serviço público”.


Cidades menores, problemas iguais. Ou maiores

As consequências da pandemia são visíveis de Norte a Sul do Brasil e não poupam grandes ou pequenas cidades. Na Baixada Santista, municípios menores como Itanhaém viram a demanda pelos serviços especializados explodir. No Centro de Atenção Psicossocial direcionado ao atendimento de crianças e adolescentes, o crescimento foi de quase 110%, passando de 962 em 2020 para 2.014 no ano passado. No Caps AD, que atende usuários de drogas, o aumento foi de quase 63%. De 682 em 2020 para 1.110 em 2021.


A Rede de Atenção Básica do município conta com oito psicólogos atuando nas Unidades de Saúde da Família (Centro, Belas Artes, Savoy, Oásis, Loty. Suarão, Grandesp e Gaivotas). No atendimento especializado, além dos Caps infantil e AD, a Cidade tem o Caps adulto, o Centro de Infectologia e o Centro Municipal de Reabilitação. Essas unidades contam com mais sete psicólogos. Segundo a Prefeitura, o público majoritário é feminino, com idades que variam de 10 a 65 anos.


“No Caps Infantil, a Prefeitura implementou o projeto Cuidar, que inclui a Secretaria de Saúde, Educação, Assistência e Desenvolvimento Social, que constrói o cuidado de crianças de maneira intersetorial, produzindo melhores resultados do ponto de vista da integralidade do cuidado e adequação às necessidades dos pacientes e seus cuidadores”, diz Bruna Martins, diretora do Departamento de Atenção Básica de Itanhaém.


A Casa da Mulher e da Criança é  um dos locais em Peruíbe que conta com serviço de psicólogo
A Casa da Mulher e da Criança é um dos locais em Peruíbe que conta com serviço de psicólogo   Foto: Divulgação/Prefeitura de Peruíbe

Peruíbe também assistiu a um boom nos números, com aumento de mais de 42% (3.927 em 2020 e 5.583 no ano passado). Oito psicólogos e dois psiquiatras fazem parte da rede pública de atendimento, que inclui Unidades de Saúde da Família, UPA 24h, Centro de Atenção Psicossocial, CAPS Infantil, Casa do Adolescente, Casa da Mulher e da Criança e Banco de Leite Humano.


Bertioga registrou aumento de 40% em 2020 e de 60% em 2021, se comparado ao número de atendidos em 2019, na Rede de Atenção Psicossocial, no Centro de Atenção Psicossocial, onde são oferecidos atendimentos de psicologia, serviço social, psiquiatria e enfermagem psiquiátrica. O atendimento psicológico também é oferecido na Atenção Básica e em casos de emergência, na UPA. A Cidade tem dois psicólogos e um psiquiatra no serviço especializado, que atende mais mulheres, na faixa etária de 18 a 55 anos.


Mongaguá também apontou aumento de 60% no número de pessoas que procuram serviços especializados na área de saúde mental, mas não detalhou os dados. A Cidade conta com uma única unidade específica, o Caps que ficana Avenida São Paulo, 3.277, no Jardim Vera Cruz, com duas psicólogas e três psiquiatras para atender a população. A Tribuna também procurou a Prefeitura de Cubatão, mas não recebeu as informações solicitadas. (RQ)


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