Pacientes do litoral de SP lutam contra sequelas físicas e psicológicas da covid longa

Na Baixada Santista, Prefeituras oferecem tratamento especializado às pessoas que sofrem as consequências pós-covid-19

Por: Régis Querino  -  04/04/22  -  10:22
Atualizado em 04/04/22 - 15:11
Seção de Recuperação e Fisioterapia da Zona da Orla/Intermediária atende pacientes em Santos
Seção de Recuperação e Fisioterapia da Zona da Orla/Intermediária atende pacientes em Santos   Foto: Matheus Tagé/AT

Os números em baixa de novos casos e mortes da covid-19 demonstram que a pandemia está arrefecendo no mundo. Mas para milhões de brasileiros acometidos pela doença, o pesadelo ainda não foi superado. Depois da fase da infecção aguda pelo novo coronavírus, muitos pacientes desenvolvem a chamada covid longa, com sintomas e sequelas físicas e psicológicas que afetam a qualidade de vida.


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Segundo a Organização Mundial de Saúde, entre 10% e 20% dos pacientes considerados curados da covid-19 podem apresentar alterações no organismo e desenvolver o quadro de covid longa. No Brasil, segundo a Revista Pesquisa, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), essa estatística representaria entre 2,8 milhões e 5,6 milhões de pessoas.


Pesquisadores de todo o mundo estudam os danos que a covid-19 pode acarretar aos infectados, mesmo após a cura. E se já é possível detectar que a maioria dos pacientes consegue se reabilitar, ainda há inúmeras dúvidas sobre as consequências causadas pelo vírus. Estudos mostram que muitas pessoas lidam com os efeitos da doença durante meses. Em alguns casos, o calvário pode levar anos em busca da plena recuperação.


Os relatos mais comuns dos pacientes curados da covid-19 que continuam em tratamento são de cansaço, falta de ar, fraqueza muscular, dor de cabeça, perda de memória e concentração, e transtornos psicológicos/psiquiátricos. Casos mais severos levam alguns enfermos a necessitar de acompanhamento com especialistas em pneumologia, cardiologia e neurologia.


Confira os locais de atendimento na Baixada Santista


Equipes multidisciplinares

Na Baixada Santista, as Prefeituras disponibilizam atendimento especializado às pessoas que necessitam de cuidados pós-covid. E muitos desses serviços são oferecidos por equipes multidisciplinares. Em Santos, os times formados por fisioterapeuta, fonoaudiólogo, psicólogo e profissionais de enfermagem desenvolvem um projeto de tratamento individual, de acordo com as sequelas apresentadas pelo paciente.


Em casos mais graves, quando a pessoa está debilitada e necessita de dieta ou oxigênio, a Seção de Atendimento Domiciliar assiste o paciente em casa. A solicitação de acompanhamento domiciliar é feita pelo hospital antes de o paciente receber alta. No caso de pessoas que já saíram do hospital e se encontram acamadas, um familiar deve solicitar o atendimento domiciliar na policlínica de referência do endereço de moradia do paciente.


“As sequelas físicas são acompanhadas pelas psicológicas, que são tratadas em conjunto. Há muitos casos de transtornos depressivo e de ansiedade. Há pacientes que têm muito medo de contrair novamente o vírus e desenvolvem reações raivosas às pessoas que não se cuidam, se aglomeram e não usam máscara. Eles procuram encontrar responsáveis pela doença e os atritos são recorrentes”, observa o psicólogo Fábio Serrão Franco, que atua na Seção de Recuperação e Fisioterapia (Serfis) da Zona da Orla/Intermediária, em Santos.


Segundo Franco, a covid-19 acabou trazendo à tona, mais cedo, pessoas que já tinham a pré-disposição de apresentar quadros depressivos e de transtorno obsessivo compulsivo. “Sem dúvida alguma, o número de pessoas afetadas emocionalmente aumentou muito a procura por tratamento, não só psicológico como psiquiátrico, fisioterapêutico e medicamentoso”, diz o psicólogo.


Para pacientes que apresentam esses quadros, lidar com o luto e a incerteza em relação ao futuro acentuou a ansiedade, as manifestações de pânico e o estresse pós-traumático. “O luto pode não ser especificamente em relação ao falecimento de familiares. Muitas vezes, a gente tem que lidar com as mais variadas perdas, de condicionamento físico, das potencialidades que o corpo oferecia, mas que agora, com as sequelas, não oferece mais. Conviver com a falta daquele corpo que não existe mais é um trabalho mental que demanda auxilio psicológico”, afirma Franco.


Guarujá tem dois Centros de Recuperação e Fisioterapia que atendem a população
Guarujá tem dois Centros de Recuperação e Fisioterapia que atendem a população   Foto: Divulgação Prefeitura de Guarujá

Sequelas respiratórias

De acordo com a gerente do Serviço de Recuperação e Fisioterapia da Prefeitura de Guarujá, Elizandra Cabral Teixeira, atualmente há 22 pacientes inseridos no programa de atendimento a pacientes com sequelas da covid-19 no Município. Desde a sua implantação, em agosto de 2020, o programa já atendeu 1.362 pessoas. Destas, 80% possuíam sequelas respiratórias, 15% neurológicas e psicológicas e 5% vasculares.


“Temos uma equipe multiprofissional, com psicólogo, fisioterapeuta, educador físico, terapeuta ocupacional e assistente social. Esse paciente é acolhido, passa pela especialista em fisioterapia respiratória e, se precisar de outro tratamento, neurológico, psicológico ou ortopédico, é encaminhado dentro da própria unidade”, explica Elizandra.


Nas Unidades de Pronto Atendimento Dr. Matheus Santamaria – PAM Rodoviária e Enseada, fisioterapeutas atendem os pacientes internados na semi-intensiva. “Quando os pacientes recebem alta, seja das UPAs ou do Hospital Santo Amaro, se ficar acamado, recebe o Serviço de Internação e Atendimento Domiciliar, com fisioterapia em casa. Se não ficar, é encaminhado para a sua unidade de saúde de referência e, caso necessite, para os Centros de Reabilitação e Fisioterapia, que também chamamos de ambulatório”, diz a gerente.


Nesses ambulatórios, os pacientes que apresentam desconforto respiratório podem emprestar o equipamento CPAP para utilizar em casa. “Quando é concluído o tratamento de saúde, o paciente é encaminhado para atividade física em centros esportivos ou nos Centros de Atividades Educacionais e Comunitárias para prosseguir sendo monitorado pela rede municipal”, afirma Elizandra Teixeira.


Praia Grande tem oito Academias de Saúde que oferecem atividades aos munícipes
Praia Grande tem oito Academias de Saúde que oferecem atividades aos munícipes   Foto: Divulgação Prefeitura de Praia Grande

Retomando o equilíbrio físico

Nem só de médicos especialistas, psicólogos, fisioterapeutas, enfermeiros, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais dependem os pacientes que se recuperam de sequelas da covid-19. No caminho rumo à recuperação, os educadores físicos também têm um importante papel no atendimento aos curados do novo coronavírus que apresentam sintomas da covid longa.


“Cerca de 60% dos pacientes pós-covid atendidos na Academia da Saúde Rio Branco apresentaram fadiga e, desse total, pelo menos 30% apresentou dispneia (dificuldade para respirar) aos mínimos esforços. Outros sintomas bastante comuns relatados pelos pacientes foram a dor de cabeça e o déficit de atenção”, aponta o educador físico Fernando Carneiro, que recebe os pacientes encaminhados pelas Unidades de Saúde da Família (Usafas) de Praia Grande.


Segundo Carneiro, a demanda pelos serviços aumentou consideravelmente no ano passado, mas em 2022 a procura tem sido menor. Nesse trabalho, inicialmente são feitas avaliações para identificar em que escala de acometimento o paciente se encontra, para traçar o plano de trabalho, com exercícios mais indicados para cada pessoa.


“Normalmente começamos com exercícios respiratórios para devolver a funcionalidade do pulmão. Quando ocorre alguma inflamação em músculos ou órgãos, eles ficam mais rígidos e perdem a funcionalidade. E quanto menos oxigênio no organismo, mais fraco (perda muscular e funcionalidade) o indivíduo fica”, explica o educador físico.


Depois da fase de exercícios respiratórios para devolver a funcionalidade e melhorar a nutrição de oxigênio dos músculos e órgãos, que ajudam a melhorar a dispneia ao executar mínimos esforços, os pacientes são submetidos à segunda etapa no trabalho de recuperação. “Quando começa a melhorar a saturação do paciente iniciamos alguns exercícios de fortalecimento. A etapa seguinte é mesclar com exercícios aeróbios”, diz Carneiro.


Para usufruir dos serviços de uma das oito Academias da Saúde de Praia Grande (veja os locais nesta página), os pacientes com sequelas consideradas leves devem ser encaminhados pelas Usafas. Com o encaminhamento, o munícipe pode fazer a matrícula na academia, levando cópias do RG, comprovante de residência e cartão do posto de saúde.


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