Inquilinos correm em busca de acordos
Mercado de aluguel é atingido pela Covid-19. Em Santos, ao menos 25% dos inquilinos estão nessa situação, segundo imobiliárias consultadas por A Tribuna
A pandemia do novo coronavírus mexeu com o mercado de aluguel e os inquilinos estão em busca de acordos para que ninguém fique na mão ou sem teto. A procura por negociações no Estado subiu de 35% do total de contratos firmados, em abril, para 50%, em média, no mês passado. Os dados são do Sindicato da Habitação (Secovi-SP).
Em Santos, ao menos 25% dos inquilinos estão nesse situação, segundo imobiliárias consultadas por A Tribuna.
Na maioria dos casos, o diálogo tem dado resultado. Há ainda uma novidade: uma nova cláusula, pedindo um tempo menor para aplicação de multa em caso de rescisão, deve surgir em muitos contratos daqui para a frente, avaliam representantes do setor.
“90% já estão fazendo contrato de 30 meses, como prevê a legislação, mas com uma cláusula prevendo que, a partir de um ano, não haja multa contratual equivalente a três aluguéis, caso entreguem o imóvel antes do prazo final”, explica o delegado regional do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci), Carlos Ferreira.
Outras alterações também devem surgir ao longo do tempo, avalia o advogado e integrante da Comissão de Direito Contratual da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP), Victor Cerri.
“Essas relações terão de ser revistas para que não sejam fechados contratos genéricos ou de adesão, com cláusulas pré-estipuladas, que nem sempre refletem a realidade das partes. Eles terão de ser melhor amarrados, incluindo de forma mais discriminada situações semelhantes a essa”.
Sem surpresa
A mudança surge porque ninguém mais quer ser pego de surpresa. É o caso da comerciante Solange Shimizu, que jamais imaginou viver situações como isolamento social e a obrigatoriedade dos estabelecimentos fecharem as portas. Ela tem um restaurante por quilo no Centro de Santos e viu a renda e os clientes desaparecerem do dia para a noite na pandemia. O jeito foi conversar com o dono do imóvel e negociar.
“Tive um abatimento de 40%, em maio, junho e este mês, que serão pagos mais para a frente. A negociação está sendo mês a mês. Mesmo com venda na porta, não chega nem perto do que tínhamos. Foi um corte enorme e tem funcionário para pagar também. A classe de bares e restaurantes foi uma das mais afetadas”.
Preservar o bom inquilino tem sido a regra no mercado, confirma o delegado do Creci. “O contrato existe e tem de ser cumprido. Mas para quem quer permanecer com aquele locatário que paga certinho e que você sabe que realmente está enfrentando dificuldades, é interessante fazer um acordo amigável”.
Impacto
Para a gerente de locação da Silva Santos Empreendimentos Imobiliários, Heloísa Rotta, o impacto da covid-19 na vida das pessoas deixou os dois lados mais flexíveis. O diálogo virou o caminho para solucionar problemas que surgiram aos montes, conforme o tempo de isolamento foi aumentando.
“No começo, a gente ficou meio assustado também. A maioria dos proprietários usa o dinheiro do aluguel para viver. Então, não é todo mundo que tem condição de sair dando desconto. Negociamos com as partes, reduzimos taxa de administração, fizemos um bem bolado que ficasse bom para todo mundo. Em nenhum momento a gente deixou alguém desamparado”.
Cenário exige criatividade para soluções
O primeiro segmento a sinalizar que precisaria de um fôlego desde o início da pandemia foi o de locação de imóveis comerciais. Depois, com a suspensão de contratos de trabalho, redução salarial e demissões em série, surgiram as demandas na locação residencial. E cada setor recebeu um tratamento de acordo com suas necessidades.
Surgiu a moratória, na qual há um desconto imediato no valor do aluguel, porém o saldo residual será reposto mais à frente, de forma parcelada. O acordo vira um aditivo no contrato. Essa vem sendo a modalidade mais utilizada nas renegociações, principalmente nos contratos residenciais, diz a sócia da Família Imóveis, Christiane Lourenço.
Ela ressalta que, em momento algum houve um “calote institucionalizado no País”. “Porque você tem um contrato a ser cumprido e o acordo tem de ser feito entre as duas partes. Essa é a melhor alternativa. Mesmo assim, agora que chegamos ao pico da pandemia, os descontos ou moratória são dados a cada mês e não por longo período”.
Contudo, é preciso que o inquilino prove que necessita da ajuda e que foi impactado pela pandemia. “A gente sempre olha o cadastro e documentos apresentados no ato da locação, como holerites e rendas”, explica Christiane.
O que fazer
Se você está com problema para manter o aluguel em dia, procure a imobiliária e peça um acordo. “Abre-se uma negociação por meio da administradora. O inquilino pede um desconto. A gente leva a situação para o proprietário e vai argumentar com ele, porque tem de haver uma concordância. É acordo. Na maioria dos casos, há negociação. Mas existem situações em que ele precisa do dinheiro e não aceita”, explica Christiane.
Para comprovar a necessidade, as administradoras solicitam documentação que prove a dificuldade financeira do locatário. “Pedimos comprovante para saber se a pessoa teve problema com contrato de trabalho, redução de salário ou demissão, por exemplo. E buscamos a negociação com o proprietário. Os descontos têm ficado na casa dos 20 a 30%, no caso dos imóveis residenciais”, explica a gerente de locação da Silva Santos Empreendimentos Imobiliários, Heloísa Rotta.