Baixada Santista já sente efeitos das mudanças climáticas
COP26 debate clima no Planeta a partir desse domingo (31)
A partir de hoje e até dia 12 de novembro, o mundo se volta para Glasgow, na Escócia, onde representantes de 200 países - inclusive o Brasil - estarão reunidos na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26). O evento é considerado chave para reforçar o combate ao aquecimento global e proteger o Planeta. E também para estabelecer novos compromissos de redução na emissão desses gases. A meta tem sido de evitar que a temperatura do Planeta suba além de 2 graus até o fim do século.
Mas qual a relação entre esse debate e as chuvas intensas e ressacas mais constantes da Baixada Santista? Antes, é preciso analisar os números.
Dados obtidos junto à Defesa Civil de Santos, colhidos a partir do monitoramento feito pelo Núcleo de Pesquisas Hidrodinâmicas da Unisanta, mostram uma intensificação dos estados de atenção e alerta para as ressacas.
No estado de atenção, os ventos sopram entre 40 e 60 km/h, com ondas entre 2 e 3 metros. Para o estado de alerta, os ventos têm mais de 60 km/h, com ondas acima de 3 metros. Em 2015, foram 14 estados de atenção e um de alerta. Em 2019, foram 20 situações de atenção e três de alerta.
O mesmo acontece com as chuvas, com índices pluviométricos intensos em curtos períodos de tempo. A Defesa Civil de Santos dispõe de dados sobre chuvas desde 1940, quando o índice anual pouco passava de 2 mil milímetros. Em 2019, o índice foi de 3.296 e, em 2020, 3.339, com uma concentração anormal de chuva nos meses de fevereiro e março, mês em que ocorreram deslizamentos de terra em Santos e Guarujá, provocando mais de 20 mortes e dezenas de desabrigados.
“Estabelecer a relação entre causa e efeito não é simples, mas no caso do ciclo hidrológico, um dos impactos das mudanças climáticas é esse mesmo: secas prolongadas e chuvas muito intensas em espaço de tempo muito curto. Esse tipo de impacto está previsto no IPCC”, diz Fábio Feldmann, ex-secretário de Meio Ambiente de São Paulo, deputado constituinte e especialista em mudanças climáticas.
Feldmann defende, inclusive, que a Serra do Mar receba legislação protetiva extra, acompanhando o que prevê o Artigo 225 da Constituição Federal, que a classificou como patrimônio nacional. “Com o aumento dos desastres naturais e chuvas intensas, essa área vai ficar ainda mais vulnerável. E isso não é bom para a Baixada Santista”, diz.
A Seclima finaliza nas próximas semanas um Plano de Ação Climática para Santos, que deverá ser apresentado em dezembro.
Entre outros itens, o plano considera os impactos das variações climáticas devido a problemas de uso e ocupação do solo das últimas décadas, a ocupação desordenada de espaços e construção de palafitas, entre outros aspectos. E proporá um conjunto de ações a serem adotadas para mitigar os efeitos nas próximas décadas.
O Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) foi criado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) em 1988 com o objetivo de fornecer aos formuladores de políticas avaliações científicas regulares sobre a mudança do clima, implicações e possíveis riscos futuros, bem como para propor opções de adaptação e mitigação. Atualmente, o IPCC tem 195 países membros. O último relatório, de agosto, prevê que somente cortes ambiciosos nas emissões manterão o aumento da temperatura em 1,5°C, o limite necessário para prevenir os piores impactos climáticos. Em um cenário de altas emissões, o IPCC constata que o mundo pode aquecer até 5,7°C até 2100 – com resultados catastróficos.
“Se ela passa a ter conhecimento, verá relação entre causa e efeito. O passo seguinte é mudar alguma coisa no seu cotidiano”.
Fábio Feldmann vai além, e cita iniciativas que podem ser adotadas até pelas pessoas que investem em ações. “Se eu vou investir na Bolsa de Valores, quero saber se as ações que estou comprando são de empresas que estão preocupadas com isso. No momento em que a empresa percebe que ela está com suas ações desvalorizadas porque não tem preocupação com questões ambientais, ela muda de postura. Esse é o melhor recado que o mercado financeiro pode dar, e está ao alcance das pessoas também”.
Os oceanos têm papel fundamental no equilíbrio do clima do Planeta. O grande volume e a alta capacidade térmica da água fazem do oceano o regulador do sistema climático, reduzindo as diferenças de temperatura e criando um ambiente adequado para a vida em quase toda a superfície da Terra.
“70% do planeta é água, então, imagine o seguinte: vivemos em um grande banho-maria, em que os continentes ficam sobre a água. Se ela esquenta, o continente sofre”, compara, de forma lúdica, o professor Ronaldo Christofoletti, do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e membro do Grupo Assessor de Comunicação para a Década do Oceano da Unesco.
Além disso, os oceanos também funcionam como uma espécie de “correia transportadora”, explica o professor. Nela, ventos frios e quentes são carregados de um ponto ao outro do Planeta. Se há um desequilíbrio, essa correia funciona mal.
O professor, um dos maiores especialistas em oceanos do Brasil, explica o conceito de “sobrecarga da Terra’, que é a equação entre quanto o ser humano consome de recursos naturais e quanto a Terra tem capacidade de repor esses bens. “Esse saldo está ficando negativo ano após ano. Haverá um ponto de não-reversão”.
Impressões
“Ainda não caiu a ficha das pessoas e dos governos de que a situação é bastante grave. De 88 para cá, quando se começou a discutir mudança climática no mundo, quase nada foi feito.
“A sobrecarga dos oceanos compromete o equilíbrio climático entre os continentes. Com desequilíbrio e sem medidas para mitigação, vamos nos aproximando do ponto de não-reversão. Estamos consumindo do Planeta mais do que ele tem capacidade para repor”
“O cidadão comum pode se engajar de diversas formas.