Com Dia dos Pais se aproximando, vale pensar questões que continuam sendo repassadas às gerações

A masculinidade ensinada aos homens é historicamente ligada à agressividade

Por: Suzane Gil Frutuoso  -  07/08/22  -  13:55
“Homens precisam  de introspecção e regressão sobre como foram formados
“Homens precisam de introspecção e regressão sobre como foram formados   Foto: Adobe Stock

Em 1971, o Experimento da Prisão de Stanford, realizado pela Universidade Stanford, nos Estados Unidos, recrutou um grupo de homens para participar de uma simulação de presídio. Uma parte desempenhou o papel de preso. Outra, a de carcereiro. O estudo deveria durar 15 dias, mas foi interrompido em cinco. Os homens incorporaram de tal forma os papéis que começaram a reproduzir situações de abuso e violência.


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Quem me contou essa história foi o psicólogo Leandro Feitosa, então professor da PUC de São Paulo, que entrevistei em 2017. Ele morreu no ano seguinte, em decorrência de um câncer. Não tive a chance de dizer o quanto nossa conversa transformou minha perspectiva sobre os estudos de gênero. Entendi que meu trabalho sobre o feminino jamais seria completo se eu desconsiderasse a constituição do masculino. Que emancipar o homem da ideia de masculino que ouviu a vida inteira era urgente - ou a violência contra a mulher nunca pararia.


A masculinidade ensinada aos homens é historicamente ligada à agressividade. Essa educação tóxica é fonte do ódio ao feminino e de posturas brutas que permeiam o cotidiano, nossa vida social e política. Impacta os próprios homens emocionalmente e a capacidade de manterem relações saudáveis. Com mais um Dia dos Pais se aproximando, vale pensar questões que continuam sendo repassadas às novas gerações. De quanto o masculino é definido por crenças como ‘é apanhando que se aprende’; ‘sentimentalismo é frescura’; ‘homem pode, manda, tem cargo de chefia e ganha mais’.


Na lógica de dominação do patriarcado, ou ele tem poder ou é fracassado. Meninos que observam os pais agindo assim tendem a repetir tais padrões perigosos no futuro. Meninas que acompanham as mesmas cenas passam a acreditar que violências são parte natural dos relacionamentos. Não raro, e isso ainda é pouco dito, parte delas também se torna violenta.


Penalizar o homem que agride é apenas parte do processo. Por isso, os chamados grupos reflexivos se tornaram tão importantes. Presentes em muitas cidades, alguns, como determinação da justiça para aqueles que agrediram companheiras, são terapias em grupo com duração de até seis meses. Os participantes chegam se sentindo injustiçados. Com os encontros, revelam solidão e pobreza de recursos emocionais. Ao longo dos meses, veem os encontros como a possibilidade de diálogos que nunca viveram.


Lembro do professor Leandro, pioneiro do método no Brasil, afirmando que, entre os homens que não participavam dos grupos, a reincidência em violência doméstica era de 75%. Entre os que participavam, o índice caía para 5%. Um indicativo de que o comportamento pode ser mudado com a internalização de novos conceitos sobre o que é ser homem.


A transformação feminina está sendo levada adiante por mulheres cada vez mais conscientes de seus direitos. Os homens precisam de introspecção e regressão sobre como foram formados.


São necessários espaços que permitam ressignificar a identidade, repensar o lugar nas relações e criar novas perspectivas para a educação de suas filhas e seus filhos.


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